28.12.05

Neandertal

Artur carregava a sacola amarela com propaganda de supermercado. Dentro, uma embalagem cinza com três camisinhas cheias de vácuo.

25.12.05

Máximas mínimas

Nem todo sacolejo é um sacrilégio, assim como nem todo relógio é lógico.

Ho Ho Ho

24.12.05

Dissabor de Natal

Está tudo pronto na casa de bonecas. A menina de cabelos negros, sentada com postura incorreta, diverte-se com as pecinhas de montar: panelas, mobília, pessoas... tudo ali obedece aos seus desejos, tudo ali é seu mundo, tudo ali é súdito de sua majestosa vontade maldita.

Na casa de bonecas o Natal é ensaiado. Tem que começar com a ceia (o peru de plástico é irresistível), passar pelos cânticos chatos (uma enjoada Noite Feliz é entoada) e acabar com o Papai Noel da meia noite trazendo presentes vazios para a criançada marionete.

A menina de cabelos negros é uma onipresença. Raquítica (para ficar na moda) e falsa-rica (para ostentar-se soberana), tem na agenda os planos metabólicos (porque não os assumiria diabólicos) para o ano que vem. Em pele de cordeiro, sempre.

Vai trazer muita tristeza. Mas a carinha de anjo não se cansa de jingle bells.

23.12.05

Os corações trocados

Amassei duas canetas
Quebrei o cadarço
Tropecei no papel
Desamarrei a pedra que tinha no meio do caminho, que eu poderia chutar, que eu poderia pular, que eu poderia cuspir em cima, que eu poderia
Ignorar.

19.12.05

______

Seidemenos
Sódemais
Sentimentos sortidos
Sortimentos
Saudades avessas.

18.12.05

Ambientações. Roucas. Necessárias.
Poucas.
Um tanto loucas, mas nada libertárias.

Do ponto de vista da dor

Um ai ou um ui podem ser muito mais que gemidos. Podem ser, por exemplo, o dilacerar do fio da nova faca gritando por sangue. Podem ser também:
* o escorregão amarelo de quem já está morrendo;
* o suspiro lancinante dos corações amassados;
* a decepção sem volta de quem antes era só confiança;
* a amargura latente dos vértices endiabrados da mente;
* etc.
O etc. é sempre a pior parte.

Ambientação #5 ::: As farpas moram dentro do ponto do ponto de interrogação

Yes.
Garatujas não entram no espaço aqui porque não interessam. Amanhã é fôlego e bem sei que o atrito impera quando o caos dorme.
Relâmpagos.
Gotas.
Estranho, pincéis neon.

15.12.05

Ambientação #4 ::: No arame, o equilibrista procura o ponto da ebulição momentânea

Caminhar pelas pedras do silêncio é como rasgar corpos. Escorre um filete de sangue, violento, vício, cio, lento. Depois é o cócix e o nada interpretando o vértice da dor. Estou condenado ao vazio, à solidão, aos solilóquios antes de dormir. À cama larga onde não encontro o que não sejam dois travesseiros.

Depois dizem que quem atira é bruto.

Fogos de artifício.

14.12.05

Ambientação #3 ::: Escorregador de araque

Das tripas o coração é mentira. Também não tem nada de vida generosa, bobagens em geral, maledicências banais. Vivia numa casa de bonecas onde o simples tilintar arrogante era truque. No caminho, as traças. Não as que devoram papel, mas as onívoras, terríveis. No caminho, as traças. E não sobrava coração batendo porque tudo ia para os estômagos famélicos delas. Doutroladodelá.

13.12.05

(*)

O absurdo é um ente que sussurra respostas prontas. Participa de leilões e arremata tudo pelo dobro mais um. Odeia reticências.

11.12.05

Ambientação #2 ::: É preciso sair de cena sem dar bandeira

Caibo num funil. Metálico. Um tanto enferrujado, mas não muito velho. Apenas mal-cuidado, um desaforo. Enveredo-me nele até sumir boca abaixo. Ninguém dará pela falta de mais um idiota de óculos, barba por fazer, cabeça estranha e sonhos de travesseiro. Ninguém dará pela falta: faz tempo que os corações não estão mais apaixonados.

9.12.05

Ambientação #1 ::: O triste sem abóboras, de cócoras

Os sonhos, em espiral, costuravam-se inversamente à preguiça disfórica que enunciava as catástrofes do século. Três a um, sempre.

Em maio, o meio-termo.

Em junho, o azul endiabrado vestindo-se.

Em dezembro nunca há mais nada. O que foi já passou.

8.12.05

Churrasco de Natal

Noto que no Natal, Neto duvida dos dedos de Deus digitando a vida e dedica a ele uma ode invertida pelo avesso das bolas das árvores da noite enfeitada:

“Papai Noel, em tempos de Ibama e essa ladainha de direitos humanos dos animais, aposentou compulsoriamente as renas. Agora andeja pelos telhados, uns quebrados e todos em mau estado. Entre tropeços, garimpa orifícios de onde a fumacinha anuncia chaminés.

Jamais espia. Corre contra o tempo porque seu sonho é terminar o trabalho logo, para um dia passar o Natal com a família.

Quase escorrega:

- Malditas telhas! – coça a barba branca, que já faz tempo não é postiça.

Entra.

De saco cheio, descobre na prática que no Brasil não há lareiras. Só braseiros onde a carne arde. Ai!”

24.11.05

Pra blogar hoje

Não sabia onde encontrar tal destino, tal sacolejo de ônibus, tal nada. Era um andarilho sorridente:

- Dê cá este texto pra eu testar.

E assim começava a diagramação de mais um livro, livre.

21.11.05

Café

Um caroço esmagado na cabeça não garante o trabalho da pressa tampouco o ritmo da crença ou o fruto partido ao meio.

Meio? Que meio?

O mesmo que falo e assumo, aquele que choro e me perco, o sim que sussurro e simples mente.

19.11.05

Estar

Concebi duas vidas de aniversário e as plantei sob a sombra do fio varálico. Do varal. Pra ninguém mais achar meu celular nem se esconder debaixo do tapete.
A vida é um trapezista de pernas tortas e grandes e feias, pronta para devorar as rebarbas do planeta. "Corre que lá vem a cor neón", grita. E depois sai anunciando aos profetas que ninguém jamais vai ser surrado com o soco inglês de madame Ali Walla Ali.
Comecei comendo um bombom. Juntei as embalagens para brincar de televisãozinha. Cuspi tudo.
Quando crescer quero ser uma TV de 29". Minto: quero ser um espirro, um jorro, um espasmo.
Quando crescer quero ganhar um presente de dia das crianças.

17.11.05

Sins

Como se fosse possível apunhalar o próprio umbigo, defenestrou-se rumo ao abismo.
Respirava o ar impuro dos pusilânimes e fracos. Não sonhava, não se sabia, não era.
Em dias de escuridão, brincava de inventar estrelas.
No inverno, saía para colhê-las. Jamais conseguia, não as encontrava.
Era todo de negações. Negava até o não.
Em vinte e três de maio de dois mil e seis, alguma coisa vai lhe acontecer.

15.11.05

feriado

é para os fracos,
assim como ferido é para o frasco.

14.11.05

Lamúria

Rima bem com desespero, dor e falta de ar.

10.11.05

Ilusão

na verdade
isto aqui do dobro
não é nem a metade

uma perna bamba
na corda quebrada
que brada:
olha o tombo!

se virar pelo avesso
dois sóis
que despeço
adeus!

9.11.05

Com suas asas brancas, o demônio domina molduras estereotipadas e, livro na estante, brinca de quebrar instantes.

Solo.

8.11.05

O trepador emérito

Apolíneo gabava-se para todas as mulheres: ninguém melhor que ele para alcançar as frutas do alto da mangueira.

7.11.05

Valfrido é um fingidor

Palhaço de mentira, seu trabalho era rodopiar em público. Abria um braço, outro, equilibrava-se na memória e depois fingia escorregar. Escorria. Nunca experimentara o tombo dos inexperientes.

Seu nome era Valfrido, e todas as suas irmãs costuravam palavras nos livros velhos da biblioteca municipal.

6.11.05

Economia

Faz tempo que não tem pedra no meio do caminho. O prato quebrou, mas os cacos não machucaram ninguém.

Dentro, um túnel.

3.11.05

Apenas um suspiro sem explicação nem vontade

Trafegar era aquele exercício de ninguém mais. Da montanha ao céu, do céu ao abismo, do abismo à morte.

Caudalosa, ficava imaginando quedas e pensando um dia se tornar cachoeira. A vida não é pra sempre e as quimeras também morrem derretidas.

2.11.05

Finados

Feriado nublado
Mesmo no trabalho.

1.11.05

Buriti

As mesmas árvores que avisto
Aviltam o verde nu
folhagem
arabescos
absurdos

Quando eu crescer quero trepar no alto da palmeira
só pra escorregar
infinito
rumo ao tombo.

31.10.05

Ronco

Aqui
qualquer poesia soaria ridícula
porque perto do deslumbrante
as palavras são cortinas.

21.10.05

Sem Internet

A rede de dormir não me permite atualizações.
Só expectativa e inspiração.
Aguardos guardados.

18.10.05

No sorriso

Um traço e outro desdém.
Praça de
sinceridade
comprada.

17.10.05

Da Parede

As barbas brancas me sorriem.
Estúpido fato, estupefato.
Necas.

15.10.05

Processo

Enorme, o progresso informa:
Não há mais progresso no que processo,
só há processo
processo
processo
e forma antes de função
forma pra funcionar
esta
estética.

No ar, o arco do arquiteto.
Num rasante, rastreia o alvo
que ainda nem existe.

A beleza está em tudo que é pra ser inventado.

12.10.05

Pra Sárgada

enquanto meu superego
procura e não arruma
emprego

meu id
ri
de mim.

10.10.05

Id Ni San Shi

Go
Ro
Shit
Rát
Kil
Dju.

Alligator!!!

9.10.05

Earthquake

Há a comemoração pelo desgosto, o sonho não cumprido, o CEP esquecido, a história interrompida.

Reinaldo era desses que confundem sabores. Embebedava-se de café, sem saber que a viagem estava agendada para o dia seguinte. Rumo: Bauru.

As tragédias não merecem ser esquecidas.

7.10.05

Ao Poema

Persigo o poema
como quem foge da dor:
cada soluço é um arrepio
cada arroubo é um desespero
cada pedido é um deus perdido.

E de minhas barbas
escorre, lenta,
uma tinta tão bonita...
que às vezes penso ser o poema
útil.

5.10.05

No meu sonho
todas as pessoas são tristes.

A diferença
é que umas constroem pontes

Outras
se atiram lá de cima.

poema preguiçoso

A rede sempre sorri pra mim o esboço de um convite
Sente-se.
Deite.
Durma.

26.9.05

Sete (ou Receita)

Extrair
da dobra o nada
da obra o cada
do cadarço o ranço.

Depois
perder tudo.

Perder-se
agulha na palha
cachorro louco
caminhão.

Depois
prender tudo.

Com um clipe especial
tamanho GG
prender: caminhão
dobra cadarço
cada obra
nada ranço
louco palha
agulha cão.
Prender-se
à chaves, muitas.

22.9.05

Dois

Não quero mais morar no lugar-comum
Antes ser ausência.

Antecipação

Não me adiantam mais
os pedaços de Deus
que brotam das feridas.

Agora tem dias
que adentro multidões,
sacudo algodões,
costuro adeuses,
desfaço saudades.
Sou fluido.

Quero o todo.

21.9.05

Confissão Entrecortada

Sentado
Escrevo nada
Devagar

O que era pra ser curva de rio
Quedou-se desvario.

Sentido
Vejo-me nada.
Invejo-me.

19.9.05

Repúnica

Covardia era ele só ter dezoito dentes na boca e ainda assim se importar com os fatos. Vamos chamar de fatos aquela relação escova-pasta-soco-na-cara-travesseiro.

Respirava o ar sujo que vinha da janela. Não, não tinha retrovisor. E seu filtro fazia tempo que só tinha água estragada.

17.9.05

Vontade

Tenho uns quatro poemas na manga e uma vontade incrível de blogar. Vocês vão entender.

13.9.05

Boutade

Tinha uma piadinha pra contar nos dedos. Perdi. Escorreu pela manga da camisa e escorregou pelo buraco do bolso de trás da calça Lee.
Era uma vez, três porquinhos...
Era uma vez, num mundo distante...
Era uma vez, uma menina de chapeuzinho vermelho...
Era uma vez, há muito tempo atrás...
Era uma vez, no belo reino da...
Era uma vez, sete anões...

Inventei outra piadinha pra contar nos dedos, com uma pitadinha de pimenta vermelha. De dar dó. De arder. No duro.
Tem mas acabou.

Néctar

Não há nada mais grave do que despencar. Como uma banana. Sem ser amassadinha.

Eram duas da tarde quando Reginaldo virou patê.

10.9.05

:::para extração de petróleo

nada melhor do que cobaias!

9.9.05

PoemAmante

Na cadência estúpida da vida,
Transparece nítida a dádiva
de te amar a cada dia
sem dúvida
nem nada.

Rasgo a camisa
E, por dentro, no peito
onde a brisa bate,
É meu coração quem diz:
- Te amo! Te amo! Te amo!

Adiante: a dívida do viver-junto
A ser cobrada no dia-a-dia
e na noite-a-noite.
Adentro: o adeus da saudade,
a simbiose onomatopaica do orgasmo,
a cidade que se apaga
aos teus olhos que se me apegam.
A dança adianta os passos
na cadência estúpida da vida
onde a única dádiva é o amar-te.

8.9.05

Muito obrigado

Então hoje não tem post.

7.9.05

YyYyYy

O inventor de palavras declarou solenemente que a vida é um amontoado de conhecidências. Umas tortas, outras sem cobertura de calda de morango mesmo.

O inventor de palavras é um velhinho caolho que mora nas veias cinzentas de meu cérebro. Não cobro aluguel.

6.9.05

sina(l)

Sou comumente confundido com um origami amarelo.

Quando nasci, enquanto o médico surrava minha bunda, ouvi mamãe me dizendo:

- Vai filho, vai ser papel na vida!

Eu não entendi que ela falava de teatro.

5.9.05

Manifesto de Desaniversário

Aniversário é sempre sinônimo de Parabéns pra Você. Não pra mim.

Claro que a falta de iconoclastia não permite que dispensemos ou abramos mão dos cumprimentos. O ser humano é nervoso. Eu sou tímido. Sou cabisbaixo quando preciso e sussurro um assentimento de concordar.

Mas parabéns, essencialmente, deveria ser reservado às conquistas. Aniversário todo mundo faz. Tirante os mortos, evidentemente.

Contudo, que graça há em competir com os mortos?

2.9.05

4

Em dias de jogo, Seu Espiridião parece outra pessoa. Fanático, fica irrequieto o dia todo, curtindo a expectativa nervosa de mais uma derrota de seu time. Não sabe onde guarda as mãos, mete os pés nos bolsos, encosta a língua no céu da boca e tirita os dentes. Seu Espiridião sofre.

Quatro da tarde e a tevê da casa de Seu Espiridião já está, há muito, ligada no canal certo. A voz do narrador chato ressoa pela casa, a bola rola. Mas onde está Seu Espiridião?

Ele nunca é torcedor de sofá. Sofre.

- Sou azarado. Se assisto ao jogo, meu time perde.

Então prefere caminhar pelas ruas da cidade. Caminha muito. E, de cinco em cinco minutos, apanha o celular:

- Alice! Quanto tá o jogo?

1.9.05

3

Dona Alice, 45 anos, é a mulher do Seu Espiridião. Ele foi o único homem da vida dela, mas a recíproca, infelizmente, não é verdadeira. Coisa dos velhos tempos. Ou não. O certo é que Dona Alice cultiva o esdrúxulo hábito de colecionar palíndromos.

- Até Reagan sibarita tira bisnaga ereta! – grita, eufórica, pela casa.

Ela jura, de pés juntos, que é a autora do célebre “socorram-me, subi no ônibus em Marrocos”. Ninguém acredita na pobre Dona Alice.

31.8.05

2

Seu Espiridião tem uma filha linda. Cabelos longos, encaracolados. Estudante universitária, 21 anos. Corpo esbelto. Sorriso no rosto. Soraya, o nome dela.

Soraya, desde pequena, sofre com a síndrome do prato bem-organizado. Isso significa que ela não admite almoçar se o caldo do feijão sujar o arroz branquinho. Ou se o molho do bife escorrer na salada. No prato de Soraya, tudo separadinho.

Soraya é daquelas pessoas que se dão bem no bandejão.

1

Seu Espiridião tem 49 anos. Em dias normais, é um cidadão pacato: conta piadas preconceituosas, joga truco com os amigos, bebe uma cervejinha, trabalha feito um condenado, reza pra chegar logo sexta-feira, torce para o Corinthians. Torce para o Corinthians?

Sim, e aqui temos um gancho perfeito para os dias anormais do Seu Espiridião. Não, desta vez não estamos criticando o time que se tornou filial amarelinha do Boca. Não, desta vez não vamos fazer nenhum trocadilho politicamente incorreto. Não e não. O problema está é na cabeça do Seu Espiridião.

Homem de superstições estranhas, ele tem lá suas manias. Dorme sempre com o travesseiro virado do mesmo lado, escova os dentes sempre de baixo para cima, mostra sempre dois no par ou ímpar, jamais leva velas ao cemitério, jamais cutuca o nariz em público e, principalmente, nunca, mas nunca mesmo, fala três vezes seguidamente a mesma palavra. Superstições estranhas, ele tem lá suas manias.

- Princípios! – corrige Seu Espiridião, pronunciando pausadamente cada sílaba, como a conferir ênfase aos seus, ahn, princípios – Princípios! – repete ele, mas pára na segunda vez, para não ferir os seus, ahn, princípios.

30.8.05

Avesso a comemorações, cutucava o embigo com o próprio ego.
Sempre fora assim: encontrava multidões, respeitava; perseguia o éter que não havia; chorava pelos cantos, no fundo, no fim do dia.

Hoje acordou assustado. Ego não existia mais.

29.8.05

Tédio na Malásia

Dentro do circo há um mágico indefeso e inábil
cheio de truques repetidos e sonhos já sonhados.
Dentro do circo há um trailler quebrado
e uma caixa vazia.

Tédio.
A manhã não tem sol.
A noite não chega.
O trabalho não acaba.

Tédio.
O texto é sem graça, por isto o blog merece o que não tem.
Não vem.
Não. Sem.

28.8.05

Casal Perfeito?

Tolo eu de sempre acreditar que a Mãe Natureza era bem-casada com o Pai Tempo.

(da inútil série Impossibilidades de Convivência: Espaço-Tempo)

26.8.05

Estultície

Um poema não rima que nem pão com mortadela ou senão nos olhos dela. Um poema não rima.

Poema é a lágrima.

25.8.05

Jornais de Papel

Havia, num tempo.
E as pessoas paravam para ler. E as pessoas liam. E as pessoas passavam.

***

Armando mandou Amanda amar Amado. Amanda amou, amou e amou. Amado aproveitou o sentir-se amado, como nunca havia antes. Amanda amou: cuidava, ouvia, conversava.
Na cama eram um só. Não só na cama.
Na mesa eram dois pratos.
No banho, um chuveiro.
Quando Armando voltou da América, Amanda não quis saber mais dele.

24.8.05

Estresse

Fadigado, tinha olhos cheios de azucrinação. Não eram azuis, mas para ver melhor sabiam tudo de que há de ser. Havia. Sabiam. Conquistamos.

Sempremente me sinto como uma laranja que virou suco no mês passado. Caso bagaço houvesse.

Pode vender

Agilberto agia por pura obsessão na construção dos nadas de arame. Artista nato, conduzia os fios como se jamais fossem se enrolar. Como se fossem paralelas infinitas.

Depois fazia de conta que era tudo parte da vida e botava à venda.

23.8.05

De Aniversário

Deu a ela uma rosa dos ventos, que prontamente se foi despetalada em bem-me-queres.
Desnorteada, viu-se de cruz em punho para endeusar o que quisesse:
- Saravá, poesia! Abra e cadabra que hoje eu quero tropeçar nas velinhas de bolo novo!

Deu a ela um bolo para morar no porta-retratos de família ao lado da bola.
Ela chutou e marcou cinco gols de placa.
Era MHB 2005 e tinha Rio de Janeiro - RJ escrito em cima.

Deu a ela um pouco de esperança plantada num vaso. Era para ficar ao lado da janela.
Mas deram a descarga.

Ao Amigo John Lennon

Todo dia eu grito adeus ao espelho retrovisor. Para me arrepender em seguida e morrer de tédio gargarejando cepacol.

Mania de Malásia

Na ponta direita da Ásia, joga um nome que se chama Malásia.
Levanta pra ninguém cabecear.
Escorrega e o juiz não apita.
Soluça e não sorri.

Some no mapa. Aplaca. Amassa.
Atraca no porto inseguro do Oceano Índico
que não aponta o revés da vida.

Todos os seus pecados
são capitais do petróleo oriental.

22.8.05

Realidade

A ética na política
é escovar os dentes
todo dia.

20.8.05

O dormir da deusa

São dez da noite e aquela beleza para a qual me prostro num misto de contrição, devoção e paixão, já repousa. Descansa. Olho para ela e fico imaginando esse milagre dos olhos verdes que continuam lindos mesmo quando olham para dentro.

Ela me aguarda no travesseiro que dividimos.

19.8.05

Não

Por engano.

Trevo de quatro folhas

Humanidade não é poesia. Humanização também não. Ao negarmos os direitos básicos aos criminosos, ao sermos intolerantes com eles, estamos negando a nossa própria civilidade e a capacidade compensatória que nosso cérebro tem. Estamos negando a capacidade humana de associar a pena ao ato, pois que reduzindo o contra-ato ao ato.

Veredicto Irrevogável

A esperança é sempre a última que morre, assassinada com três tiros no coração.

Às pessoas

Fiquei observando as pessoas por horas e horas. Era estranho reconhecer nelas rituais antigos e não-concernentes à realidade hodierna.

Pareciam animais selvagens.

No acasalamento, dançavam estranhamente ao redor dos parceiros em potencial.

Na fome, corriam abruptamente procurando um lugar à mesa.

No sono, chatamente recorriam ao relógio para justificarem a vontade súbita de ir para casa.

Pareciam animais selvagens.

Eu sempre me arrependo de observar as pessoas por horas e horas.

Pessoas Normais

Pessoas normais: não tenho saudades de quando era possível encontrá-las pelas ruas.

18.8.05

Seu sonho

Um navio com cinco rodinhas e a gente dentro girando de tanto enjôo de tanto mar de tanta maré. Um tiro fura o casco:

- Cacete! Afundaremos no Juquiri!

Neve. Salva-nos porque congela todo asfalto e, enquanto o sol não derreter tudo outra vez, não seremos náufragos do solo.

- Um mais dois são três?

Um navio com cinco rodinhas e um cavalo puxando-o com todo o peso e nada a pressa. Um tiro a tirar do sério. Eu, armado, pronto para defender as meninas:

- Este mundo está carecendo de heróis!

Fugi para os quadrinhos.

17.8.05

mais triste que ser lua é ser loser minguante.

16.8.05

Treco

Nem tudo o que cai da ponte tropeça na borda. Há as fezes dos pássaros, há os pingos de chuva, há as folhas que o vento carrega. Nem tudo o que cai é volitivo.

Trecho # -5

Pisou na Lua em 1969, vestindo pesadas roupas que flutuavam. Retornou com a boca ressequida pelo trauma do sabor cumprido e a ressaca do prazer experimentado. Era uma bela história, que certamente seria compartilhada, contada e recontada a seus filhos, netos, bisnetos... Se herdeiros ela legasse ao mundo.

15.8.05

Trecho

Em seu primeiro emprego ela era bailarina de enfeite. Ficava na mesa do chefe e dançava quando ele ligava a caixinha de música. Ele sonhava com ela. Ele não sabia que ela era só do Morte. Ele não sabia que ela teria o Morte como revés, como companheiro, como indissolúvel, como alma gêmea, por toda a eternidade. Ele não sabia que amar era esse se completar onde um só é possível sendo dois.

Ela gostava de cozinhar mas nunca sabia direito a porção de água pra cada naco de arroz, ou o inverso, ou o desverso. Recitava versos sobre as panelas, como se as rimas fossem de feitiçaria. O marido não dizia nada, fingia que acreditava. No fundo compreendia a essência de ser marido.

13.8.05

Assunto Estranho

Acordei com uma plantação de balões vermelhos na cabeça. Cheios de hélio.

- Upa!

- Opa!

- Epa!

É como se o ar trafegasse dentro de cada conexão cerebral. Os pensamentos levitam sem a menor graça. A vida pára. O resto finge que flui.

De repente, não mais que de repente, todos os sonhos que estavam no bolso caem e eram vidro e se quebraram.

Estepe

Assombrado que nem um pivete fugido, Deodoro passa noites em claro sorrindo pra lua. Ele sorri de cá e ela de lá. Deodoro pensa que um dia vai ser ao contrário e só essa esperança é que o põe em pé.

Deodoro é um homem feliz.

Porque eu não acredito.

12.8.05

Olhos verdes da cor do céu

Na Malásia todos os gatos são poucos. Depois da minha-noite, quando o daltonismo é um elogio falso às pretensões de antemão.

- Corre, corre, corre!

Lá está o maratonista fugindo de três tigres nada tristes...

Na Malásia todos os sonhos se escondem no travesseiro.

Atualização Automática

O revólver está sempre à mesa, pronto para ser disparado. Tem sono, sede, fome, vontades. Que não se saciam.

Com um esparadrapo na testa, ele não dá a entender que já está enferrujado e pronto para matar todas as pessoas chatas e sem estômago. Sem coração.

Vou escorrer.

Quem sabe nalgum lugar clandestino ainda se fabriquem sonhos de bolso.

Quem sabe ainda dê para estourar bolhas de sábado.

Quem sabe eu caia em pé num domingo de sol.

Devaneios a partir de um aquário

Desde pequeno monto aquários para criar mundinhos. Mudo as pedras de lugar, boto plantas, cego o fundo... Em suma: sou Deus, perdido espaço-temporalmente.

10.8.05

Por que eu tive as pernas quebradas ao meio

Coincidência ou não, dia desses reli um velho conto do Stanislaw e ri muito. Da minha obviedade e da pobreza da vida, esta ridícula em estado literal.

...aliás!

às vezes o silêncio é o resumo da dor

silêncio

[ ]

9.8.05

Fetiche (mais sobre os sonhos que jamais se cumprem)

Custei muito a compreender que Deus era um joão-de-barro que se dedicava o dia todo à procrastinação dos sonhos. Com seu bico, novos adões projetados resmungam indefesos, mas os murmúrios se quedam mudos.

No dia em que acordei soberano, sofri as dilacerações da amálgama fraqueza de ser humano.
A Fórmula-1 petrolifica o tsunami tangencial:
- Urra, urra!, gritam os soldados de dentro de seus uniformes
E com a batuta na mão, regem a orquestra de lumpures adestrados
que falam inglês.

8.8.05

Sonhos de bolso

Do alto de seu poder em praça, o baixo executivo ordenou uma nova edição de sonhos de bolso, agora com menos páginas que é pra desilusão começar mais cedo.

Súbito, o empregado-mor murmurou:

- Mas como, se não temos peças de reposição?

Ninguém lhe deu ouvidos. A dor usa óculos mas não tem ouvidos.

Fim de um sonho

Na geladeira tinha um cubo que não estava frio. Peguei-o com as duas mãos entreabertas e fitei-o com os olhos castanhos fedendo à fumaça. Dobrei-o. Guardei no bolso.

Todo dia era assim que funcionava: o sonho morava no bolso, mas já havia há oito anos, era um sonho embolorado, musgo, sabão.

Num belo domingo, escafedeu-se como uma bolha de sábado virada no avesso pelo vento.

5.8.05

E pronto e acabou.

Jabutilândia #3

Hoje à noite duas estrelas irão brilhar dentro de seus olhos verdes, em momentos de profunda simbiose. Os suores serão apenas o resultado das sensações ímpares que o ínterim produz. A saliva. O sentimento. Os segredos à meia-luz.

Na clarabóia do céu, também confundida como lua, um guardião vai sorrir.

4.8.05

Lua

Com a lua indígena desenhada em seu nome, ela não sabe se aniversário são parabéns ou pêsames. Afinal, é a história do copo metade cheio metade vazio. Se bem que, no caso, ainda se está bem longe da metade.

O Dia "A". Ela não tem um fusca, não nasceu em 1929, não dobrou a esquina com suas próprias mãos e jamais votou em nenhum presidente norte-americano. O Dia "A". E as confusões são só reflexo de uma tensão pré que é plurianual.

3.8.05

Duro de Roer

Para não tropeçar nos nadas, gosto de andar em linha reta
como se o viver fosse um algoritmo
ou algo assim;
como se os tudos fossem de alfenim.

Em meus percursos, dispenso retrovisor
porque prefiro alçar os pretos vãos da imaginação
a ficar no lencinho branco
feito rabo abanado
dos adeuses.

Quando seus olhos rutilam em forma de meia-lua,
eu entendo que na varanda há uma flor
e na flor uma abelha virgem
carregando um sonho que nem começou:
- É preciso rediviver as vitrinas!

2.8.05

Jabutilândia #2

Nos espaços vazios sempre há um soluço em branco, pronto para acontecer de supetão. Respira.

Era dia de semana como outro qualquer, diferença é que o céu estava verde como uma uva verde. Do mesmo tom, só um pouco mais rutilante, no jeito para ser colhido pela raposa. Debaixo da parreira, uma velhinha tricotava ouvindo Pink Floyd.

Interrompemos nossa programação para anunciar os novos convocados para a seleção brasileira de futebol. É o escrete nacional pronto para mais um desafio: o amistoso da vez é contra a Croácia!"

Voltando, a velhinha tricotava ouvindo Pink Floyd. E eu, munido de binóculos mágicos, enxergava todas as formigas diuturnamente carregando folhinhas sob a atmosfera.

Uia.

1.8.05

Quando 999 é mais importante do que 1.000

Jabutilândia

Para encontrar Jabutilândia só é preciso abrir um mapa-múndi. Nem precisa ser dos mais recentes, pode ser um daqueles que têm U.R.S.S. bem grandona e Iugoslávia e Tchecoslováquia e outras coisas mais. Não, não precisa ter o estado de Tocantins.

Jabutilândia é minha Passárgada, onde tem tudo, só não tem civilização.

Jabutilândia é uma lembrança boa, guardada no começo de meu namoro.

Jabutilândia é pra onde eu quero ir quando crescer, ainda que lá quase toda a população seja analfabeta e eu não possa, portanto, viver do jornalismo.

Jabutilândia é pra onde a Tar foi quando partiu desta.

31.7.05

.

Na minha noite um coração solitário tem a forma da lua cheia de pretextos pra nunca mais amanhecer de novo.

Serba Salah

Na Malásia é assim que as pessoas se sentem
Quando bate um blue
E o sol fica frio.

29.7.05

Um crocodilo laranja correndo de mim

Por mim, comeria algodão-doce ou fugiria pro Nepal. Mas não os encontrei na lista telefônica nem no Google. Então decidi tirar férias numa praia qualquer.

- Bom dia!

- Bom, dia?

- Bom, dia!

- Bom? Dia!

- Bom! Dia?

- Bom. Dia.

O sinal de pedestres abriu e quem chegou à minha frente com sua prancha de surfe debaixo do braço foi um crocodilo laranja, óculos de sol e nívea no rosto.

28.7.05

Vidas Chatas

Absurdo do link quebrado do blog que já terá ido pro cemitério da internet. Onde mora o cemitério cibercemitério que carrega mistérios por trás dos agá tê tê pês e agá tê eme eles?

Uma homenagem apenas.

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O sapateiro Alcebíades sabia tudo de sapato. Sozinho no escuro de sua cama, pensava em tachas e preguinhos, antecipando o sonho da noite-a-noite.

Se via um fantasma, logo tropeçava em pensamento. Era desse mundo que colhia as flores e as plantava depois no jardim do castelo. Era desse mundo que sacolejava que nem as meninas que fazem ponto na esquina. Era desse mundo que os cachimbos não podiam ser fumados nem ouvidos e a única música que havia era o barulho da labuta a martelar.

O sapateiro Alcebíades, com seus anseios absurdos, tinha uma invisível capacidade de chorar. Como se fosse um aviso ou um destempero; como se fosse um chafariz que externava seu estresse diuturno.

27.7.05

- Coca-cola?
- Prajá.
- Com gelo!

***

- Coca-cola?
- Eba! Eba!
- Essas crianças... Tsc-tsc-tsc...

***

- Coca-cola?
- Sim.
- Puxa, os caras são mesmo do mal... Cada uma!

***

- Coca-cola?
- Também.
- Vamos logo que o carrinho já tá cheio.

Considerações sobre a cor dos cadarços

Quando estamos vivendo sem cabeça, as cores escorrem pra debaixo do tapete da sala. Principalmente quando falta fósforo.

Há um nó: cadarços nos entrementes se apercebem de vazios. E locupletam-se, e permutam-se, e depois se restringem.

Era uma vez um doutor que construiu o mundo dos zíperes.

26.7.05

Poema-minuto

Contando os segundos.
Ora, bolas...

Torpedo de tropeços

Meu sobrenome é Aziago. Costumo brincar que não nasci, mas fui abduzido ao contrário, se é que você me entende. Praticamente defecado neste planeta horrível, cinza, enegrecido pelo hálito.

Tive quatro cachorros vira-latas. Matei-os.

Tive vários sonhos pela metade. Matei-os.

Tive algumas palavras cruzadas. Matei-as.

Tive trinta e dois dentes na boca. Matei-os.

Tive dor e sono. Matei-os.

Agora só tenho meu livro na estante e meu corpo sobre a cama, quebrada.

Os poréns e as tramóias

Um pivete de canivete na mão cortou todo o tapete vermelho onde o príncipe da Suazilândia iria pisar quando descesse de seu cavalo da cor de burro quando foge.

- Eu não sou malvado! Eu não sou malvado! Eu só queria aparecer na Globo! - gritava o menino quando era torturado pelos policiais vestidos de farda desbotada.

Em cima da geladeira de minha casa, o pingüim assovia feliz, alheio a tudo.

Speedy Trouxa

A banana se alimentava de células travestis. Toda vez que precisava de uma nova, fagocitava os hormônios que sempre afloraram na alma dos doentes. E devorava, e devorava, e nhum nhum nhum.

Um belo dia tentou conectar-se à internet porque sabia de um certo dáblio-dáblio-dáblio onde moravam as libélulas amarelas. O sinal estava ocupado? Não. Era o super-homem? Também não.

A banda larga parecia uma bunda gorda.

22.7.05

Receita prática para tingir um cadarço de azul

- Enrosque em seus dedos.

- Amarre-o em outro cadarço, de preferência estando ambos em seus respectivos tênis. Calçados nos pés dos seus donos, obviamente.

- Conte até três.

- Saia correndo feito doido.

- Grite ajuda ao usuário do conjunto pés-tênis-cadarços.

Samambaias

Escorrem como o silêncio do passado. Apertam o passo em suas quasifolhas reverberantes que nunca que chegam ao chão. Vão enrolando vivências como quem tropeça numa pedra. Depois levantam, cospem o futuro lá lonjão.

Precisam de xaxim.

Suspiro

Sem recheio, como uma lágrima e um soluço. Infinitos.

Solto no espaço

Cordão umbilical que nada! Aquilo parecia uma mangueira conectada à uma máquina de xerox antigona.

E os etezinhos todos sorrindo que nem uma criança que vai ao zoológico pela primeira vez!

As rimas se escondem detrás do muro ou na sombra de um inquilino

Renato costurava todos os seus sonhos com linha 10. A mesma que usava para empinar papagaios e fazer malvadezas na barra da saia de sua mãe. Depois que juntava dezessete sonhos bem amarradinhos, guardava-os em feixes duplos, lá no alto da estante da sala. Tão alto que precisava se apoiar num banquinho para alcançar.
Seu irmão ficava sempre jogando videogueime. Parecia não se importar com a altura dos sonhos.

O gato Afanásio era o único que entendia Renato. Olhava com cara de sabichão, sempre. Depois desistia de ajudar e, preguiçoso, dormia no tapete. Afanásio era o único que sabia curtir a vida.

Uma ponte

Os nervos estavam tão pungentes quanto presas de mastodonte. Eu era uma ponte, não kafkiana, mas cortazariana. Cortante. Uma ponte que cortava um rio que não sabia mais para onde corria, era sangria, era mar vermelho, era obstáculo, era morto.

Quando, num dado momento, o sol veio e secou tudo. Eu era uma ponte imponente e cuspi na cara dele. Amarrei sua juba, dei três nós cegos, fiz-me surda e quedei-me paralisada, ponte.

Parcas linhas

Saudade é aquela dor pelo que não se sabe. Chega de mansinho e vai descendo pelo umbigo, contorna e volta. Nunca vai embora. É um estranho frio, não na barriga, mas no bíceps.

Quando eu tiver um cachorro vou lhe dar o nome de Saudade.

Upa-upa

As coisas ficavam dentro da caixa amarela e viviam felizes num reino imaginário. Tudo dentro do armário, dentro do quarto, dentro da casa, dentro do prédio, dentro da quadra, dentro do bairro, dentro da cidade.

A cidade nunca existiu.

Cronopolitano

O celular morava dentro do travesseiro e, quando tocava, cantarolava cócegas no inconsciente que dormia. Sempre chovia lá fora nessas horas.

O travesseiro era recheado de casca de crocodilo. Para sonos pesados. Para pesadelos. Pára, Pedro!

O crocodilo fora caçado num sáfari. Morava num rio de nome estranho e, no momento da morte oportuna, palitava os dentes com um raminho de alpiste.

O alpiste era de plástico.

21.7.05

Almaço sem pauta

Meio-dia e pouco. As pessoas trafegam famélicas e adentram sutilmente, com seus estômagos debaixo dos braços, nos botecos, restaurantes e afins.

No ínterim de cada uma, o vazio pulula e grita, roncando acidamente. Arroto ao contrário.

As vísceras ainda estão limpas, mas é só por dezenove minutos.

- Almoço sem falta!

20.7.05

Scherma

O sapo roía as unhas para mostrar a sua aquiescência ao fenômeno do El Niño para Presidente. Era uma campanha encabeçada pelas chaves do seu molho de tomate.

Foi quando ele acordou na pia batimal. Puxavam-no pelo extinto rabo e gritavam: - Jeremias! Jeremias! Jeremias!

Pronto, ganhava um nome. Mas, antes que me acusem de letárgico ou taciturno repetidor de nomes, argumento: - Trata-se de Jeremiasoutro que não o do texto lá abaixo!

Senha de coração

Não dá pra trocar e é difícil tocar.

Alguém perdeu o número? Corra para o chaveiro mais próximo. Ele não saberá o que fazer.

19.7.05

Correcorrecorre

Depois só se lembre de matar quem foi o desgraçado que inventou os preços e os prazos. Da vida.

Refazer

Era dia de semana e Jeremias não dormiu para não se dar ao trabalho de acordar. Domir-acordar era uma rotina que lhe parecia muito complicada.

Jeremias não arrumava sua cama, portanto.

Contava dia-e-noite por meio dos ponteiros do relógios, mas sempre rezava pra tudo que é santo, torcendo e fazendo figa, pois se o relógio pifasse... Coitado!

Jeremias era tão estranho quanto um canivete suíço.

Tosse, catarro, dor de garganta, febre, noite mal-dormida, cansaço, dores no corpo, gripe, nariz entupido, catarro, espasmos...

Própolis, mel, chá, comprimidos, gargarejo, gotas, cobertor e outras interrogações em caixa alta.

18.7.05

Da primeira viagem

Marinheiros capinando as plantações de alface no quintal do convés. Retiram tiriricas, defecam adubo novo, recolhem os restos do repolho da safra passada.

Do alto, o menor grita:

- Terra à vista!

Ninguém dá bola. Hoje todos preferem comprar no cartão.

Saúde, saudade e o medo de morrer sozinho

Daqui do alto da Torre, não consigo avistar você. Minha miopia é empecilho nervoso: vista turva, caracteres apagados, nuvens brancas.

Então jogo-lhe um beijo e me dou por satisfeito. A vida é feita dessas pequenezes mesmo.

17.7.05

Vícios e vazios

Quando eu era mergulhador, era comum que eu confundisse a fome com a vontade de dormir. Por isso, tratei logo de cultivar uma plantação de eucaliptos no quintal de meu apartamento (uma bela sacada de dois metros quadrados).

Funcionava assim: batia a fome, eu corria para a mudinha de árvore e começava a costurar um pezinho em outro. Daí vinha o sono e eu armava minha rede entre dois pés e ficava balangando, balangando.

Acordava de pandu cheio.

Os peixes do aquário nunca entendiam tudo aquilo: afinal, era eu o Deus que invadia seu habitat e aspirava todo o pó das pedras, passava pano no limo verde do ecrã, cozinhava ração todo-dia. Para eles, as coisas pareciam muito estranhas. Como poderia ser eu gritando por socorro com uma sucuri em volta do pescoço? Como poderia ser eu o macaco suicida a pular de galho em galho nos eucaliptos?

Acordei chorando.

Mendigo

Ele sempre quisera ser astronauta e aparecer no programa do Faustão. Não tinha todos os dentes, causa congênita, e, quando menino, chegou a usar aparelho de arame. Torce até hoje para o Palmeiras, principalmente aos domingos e feriados.

Há exatamente um ano e meio ele olhou para um casal e disse:

- Ninguém combina melhor do que vocês dois.

Pronto. Havia mudado para sempre a existência daqueles dois pares de olhos brilhantes esverdeados. Nem parecia que vestia farrapos e, atualmente, mendigava um real pra poder tomar o busão.

14.7.05

O saite perdido na blogosfera

Uma casca de limão espremida


E as coisas acontecendo tão fosforescentes, tão desmancháveis e tão doces que era uma tremenda massa de suspiro. Dentro, um par de óculos, lentes sujas, inúteis.

É preciso ressuscitar todos os gnominhos. Eles não gostam de buzinas, não gostam de barulhos, não gostam de guloseimas. O esporte esperto deles é manter relações sexuais com as páginas dos livros do Leminski.

Escrever pras gavetas, não precisa de internet


Saiu de casa cedo com uma arma enferrujada no lado esquerdo da calça. A calça estava velha demais, parecia que era feita de papel crepom roxo.
Saiu de casa cedo o bastante para matar 1587 pessoas. Ou todas as que não visitassem o seu blog.

Seu nome era Alfredo.

Geografia cheia de segredos


Sua cabeça lembrava um chester cru. Era estranho, tinha o feitio todo irregular e confundia os ônibus com as asa-deltas que sempre gostou de colorir.

Preferia maçãs a pesadelos. Mas sonhava todas as noites com um caçador eloqüente, cheio de espingardas amarelas. Espingardas, não: repito, retifico: espinhas amarelas. Daquelas cheias de pus.

Afeminado e tímido, complexado e reverberante, fugia dos holofotes e tinha medo, muito medo.

No fundo, ele detestava pontos de ônibus. E pneus furados.

Um mecânico travesseiro


Parei de contar carneirinhos desde que os bois dormiram.

::: dor de garganta <<

E a lembrança sofrível de que há uma longa e fria madrugada pela frente.

Rojões amargos.
Geladeira estragada.
Uma samambaia vai crescendo ao contrário e escalando meu prédio. Já está na metade do quinto andar. Amanhã ou depois deve invadir meu quarto, aqui no sexto, e me matar sufocado enquanto eu estiver dormindo.
Corta VT.

Sete de setembro. Lembro. A chuva reflete as lágrimas que ela verte. Eu subverto.
Fecha para seu rosto.
- Vontade de brincar! - grita, mas ninguém ouve porque estão muito ocupados assoviando o Hino Nacional.
No meio da rua, um menininho (eu) fugido do evento pátrio, brinca o futebol com uma pedra levemente arredondada.
Fica tudo preto (tá, deve ter um termo que explica melhor isso!)

No dia seguinte, manchete que estampa os jornais:
Jovem garota morre com pedrada na testa
Testemunhas disseram que ela só queria brincar

Soneto pra você escrever, à caneta, na tela do seu computador

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As luzes estão apagadas mas eu sei que você não tem medo do escuro. Então eu lhe dou um sorriso, despercebido que você não consegue me ver. Então, belisco o seu braço e finjo que não fui eu.

- Quem será o fantasma?

Corro e fecho a vidraça. Percebo o líquido escorrendo. Uma réstia da lua me distrai enquanto, na mesmice deste sítio abandonado, o cricrilar dos grilos é uma orquestra a sinfonizar minha existência.

- Onde está o fantasma?

É quando alguém tem a súbita idéia de alcançar o interruptor e acender a luz.

200.204.151.#

Fans Development Ltd.

13.7.05

Casa de Bonecas

Era uma vez um turista. Lindo como todo turista: olhar curioso, máquina fotográfica dependurada ao pescoço. Olhar curioso, dizia eu. Olhar que gira trezentos e sessenta graus, e mais giraria se houvesse, para compreender aquela atmosfera estrangeira onde se está.

Um dia o turista resolver visitar uma casa de bonecas. E ficou assustado porque ali os bolos eram de padaria. Sentiu-se tão turista ali que, impudico, tagarelou, tagarelou, tagarelou. Falou alto, sentiu-se à vontade e sem compromisso em bancar o boneconense, afinal, graças à Deus, não era dali.

Na casa de bonecas a louça estava sempre lavada, mesmo aos feriados e dias santos. Na casa de bonecas não havia internet, cachorro, fliperama, rodízio de pizza e, muito menos, gente de verdade.

Ele não tirou fotos de lá.

11.7.05

Papel do Papai

Reza a lenda que eu matei uma onça virando-a do avesso, do cabo ao rabo. Mas eu não acredito muito em lendas.

Um dia, arremessei um bumerangue a leste. Ele foi foi foi, girou o mundo e, exatamente cinco dias e três horas depois, bateu-me na nuca. Trazia carimbos e bandeiras de vinte e nove nações around the world.

Papai Noel é um velhinho que não existe. Ele rouba o meu dinheiro e ainda faz pose de quem está dando presentes legais e coloridos.

Quando trombei com um extintor de incêndio, compreendi o sentido da vida.

10.7.05

Dor e complicações

Eu devia saber de tudo, que a vida não é para os fracos.

1) Existem pessoas más. Ainda que teimemos em acreditar. E elas estão prontas a agirem, prontas para destruírem sonhos que ainda estão na incubadora. Às vezes reconheço que há uma faceta demoníaca do mundo, e está bem pertinho de quando a arrogância tropeça na prepotência.

2) Chute no saco dói. Principalmente se vem de forma inesperada. Principalmente quando não tem motivo justo ou aparente. Principalmente quando é um saco.

3) Pensamento positivo e orações nem sempre ajudam, infelizmente. Então é remédio pra dor de cabeça e pra boi dormir.

Amém.

9.7.05

Recado rapidinho

Ontem perdi um miniconto no ônibus ou no metrô. Quem encontrar, favor devolver. Ofereço boa recompensa.

8.7.05

São laços

Soluços amarram o ego
Carrego
- Vai, nego!

7.7.05

O inusitado. A parede.
O parente.

Blá-blá-blog

Conduzia o carro de portas fechadas. Aqui fedelho nenhum entra, costumava dizer, nos diários bate-papos com o toca-cds.

O ar era condicionado. Os vidros eram pretos por fora, insufilme que se chama, eu acho. Queria juntar dinheiro pra blindar tudo.

Um dia tropeçou num buraco.

Princípios Principais # 736 (fragmento em ré bemol)

A gente informa contando uma piada e entretém fazendo cócegas

6.7.05

Des-ser ou sub-ir?

(a) Tanto faz.

(b) Ambos.

(c) Des-ser.

(d) Sub-ir.

(e) N. D. A.

5.7.05

Toco de nada

O antônimo de absurdo ainda precisa ser resolvido. Talvez se chame antônio, também.

O antônimo de absurdo não pode ser odrusba, porque óbvio demais. Alto lá: evito, mas avisto que nenhum problema há: antônimo de absurdo deve ser óbvio.

Quando um beijo de bom dia não passa de um beijo de bom dia

As nuvens preteiam o céu, aquele mesmo que costuma azucrinar a presença de todos sob. Um raio não cai duas vezes no mesmo lugar; cai três, quatro, cinco.

4.7.05

Gracejos

Se eu fosse poeta faria um poema mais lindo que o outro, só pra comprar sorrisos, das pessoas. Gastaria um dia e uma noite em cada rima, e depois as empoleiraria como poeira em cascas de pão velho. Aí, num sábado de aleluia qualquer, seria muito bom assistir à lua comer a escuridão da noite. E, nós, queijos.

Grilos e gralhas

O bichinho esverdeado mora na gaveta do trabalho. Mistura-se facilmente aos gravetos tocos de lápis e usa as canetas e marca-textos para colorir o tampo da mesa. Não se reproduz; fagocita seus semelhantes. Não se corrompe; compra diariamente, com sua labuta, o leite para seus filhos destroçados.

Amanhã é terça-feira e os anjos todos dirão amém.

Nada

Vamos criar uma ode ao vazio.
Depois, procurar espelhos pelo chão.
Depois ainda, cuspir neles.

1.7.05

Edison: aprenda a esperar, aprenda!

30.6.05

Se as coisas já estão uma bosta mesmo, pra que melhorar?

Otimismo: conforto para os fracos...

29.6.05

Jaçanã

Minha casa é perto, nem preciso acordar pra chegar. Fica na dobra da esquina, no sexto andar. E tem um portão que abre quando bato duas palmas e dou um pulinho.

Minha casa é logo ali, na esquina dobrada. Dentro dela cabem outros andares e o elevador passa pelo meio. Não tem e-mail nem carta social me esperando, mas eu estou a caminho, sempre a caminho, devagarinho porque atrás vem gente sorrindo.

Minha casa é aqui.

28.6.05

Propaganda

A arma
do nego
cio.

Saite

Acordei parecendo uma raposa cheia de hiperlinques nervosos. A cada clique, uma força bruta enrolava os bigodes do meu focinho e revelava a ressaca: ontem, nove doses de uísque com o lobo-mau, anteontem, dezessete doses de cachaça com a formiga, anteanteontem, treze doses de conhaque com a ovelha... e assim, por diante, percorrendo todos os animais prosopopaicos das fábulas de Esopo e de La Fontaine.

Acordei com a cara de uma raposa do Gúgol, cheia de dáblio-dáblio-dlábios. Acordei ciberespacial e fui morar num imeio.

27.6.05

Contra pessoas esdruxulamente incompreensíveis

R-A-I-V-A

Dormir

Vale a pena ou é só travessura da cabeça?

Chegada

Sem renovar a autorização pra vida, estou nesse avesso de partida, malas ao chão, roupas espalhadas, celular descarregado.

Se eu fumasse, acenderia um agora. Mas não fumo. Tem momentos que sinto pena de mim por isso.

Se eu fumasse, esconderia toda a minha angústia na fumaça de um hollywood.
Que besteira!

24.6.05

Soro Sono Sumo

Pra respirar bem fundo.

Depois.

Daquelas mulheres

O conto era daquelas mulheres que não tinham passaporte. Mas tinham decote.

No papel amassado, o desenho do ronco da motocicleta. E tudo o mais. É o de menos. Um sorriso amarelo, cansado. Nada a ver com o pôr-do-sol gritante que repousa em si mesmo, naquilo que chamamos horizonte.

Íris? Antes... Agora é só ir. Se quer voltar, sequer.

23.6.05

Mensagens

Algumas são lupa para nós mesmos. Lupa e lampadinha. Lupa, lampadinha e diabinho da (in)consciência.

Assim vamos indo. Devagar porque atrás vem gente, e então podemos esperar a gente que vem pra de repente ainda bater um papinho.

Panelinhas

Existem por todo lado.

Principalmente em cozinha de quem mora sozinho, que cozinha pra si próprio e que faz um prato por vez.

21.6.05

(c)Alma

pra amãenar.

20.6.05

Devir cósmico

A vida é este eterno criar pra depois deletar.

+ de 36h depois das pálpebras se descolarem da cama

Desci, tentei dormir. Fechei os olhos e viraquevira na cama. Peço-te e não encontro teu corpo. Rogo-te e não vejo teu carinho em mim.

Tentei dormir. Mas na minha cabeça, reduto de incertezas molhadas, um balaio girandogirandogirando, roda-louca, girandogirandogirando, e os acontecimentos nefastos de um dia estranho.

Tem noites que o computador me consola.

O computador, me consola.

O computador, sola.

E eu, absorto no tec-tec-tec, sou quase um sonâmbulo dançando no ritmar espalhafatoso de meus dedos datilográficos (com diploma). Estou dormindo acordado, diante da tela que cansa meus olhos de anteontem.

Dentro de cada e-mail cabe um beijo sem explicação.

19.6.05

Especial de Natal

Fora de época?

Eu também sou.

Praprequecimento próprio

Sem páprica, não dá!

18.6.05

Calo-me

Piso mas tudo o que percebo é o calo de mim mesmo.

Enigmático

No meu bolso eu trago um beijo que é pra jogar nas flores do caminho. Os adeuses ficam. Os prassempres são como as manhãs que levantam vôo na neblina. No meu outro bolso eu trago nada, aquele que não perde a oportunidade de rir de mim. Pramim.

Meus tênis estão furados, parecem um buraco gigante com vazio por dentro.

Meus tênis são, cada vez mais, o retrato de meu coração. 3x4.

17.6.05

Ser o resto

Não é de todo mal ser o resto, enquanto há pessoas que não passam de parede.
Ser o resto é o real. O relativo.

Aliás, quem é que vai correr agora?

Custei

Mas descobri, enfim,
que processo não rima
com progresso.

14.6.05

Da criação
Sou o crianção
que com nuvens brinca de espelho.

13.6.05

Culpa

Será que adianta?
Será que indulta?

12.6.05

Caixa-preta

Do caco ao caos
Sou blecaute
Blindado.

9.6.05

Cronopolitano uma ova!

Quando eu crescer (ou for corajoso o suficiente) vou mudar o nome disto aqui. Vai ser
Cairós-politano, ou Cairopolitano

Bem melhor, bem melhor...

8.6.05

Auto-contemporização

Evisto o que nem asabo. Estrelisas, melhadas, miúras. Acabre, cos, tintrapra lhomesca alimanade. Cova, cova! Asul... Sebro... I sebro aboca piuta ámaco.

Trote

- Alô?
- Cataploft.
Tum tum tum tum.

I believe in love

Aquela música dos Beatles na cabeça All You Need is Love. Mas eu cantando I believe in love mesmo, como um mantra em que eu quero acreditar.

Copo vazio

E corpo cheio.

6.6.05

Vontade de explodir

Não preza os prazos a vontade que tenho de virar uma bomba-relógio. Lógico. Não abre a cabeça, não abre a barriga d´água. Não chora mais. Prazos, preces, prisões, problemas, pruuuum!

Desanimado

Enfezado de afazeres.
Fiz-me fato. Afiado. Fraco. Fedido.
Afaga meu ego?

3.6.05

Retrato 3x4

Triste. Traste.
Trust me triacanto.
Trecho de mim, na trave: trívia.

Criar nova postagem

E, depois, correr pro banheiro-escovadedentes-águanorosto-chuáchuá-vaso-descarga-águadenovo-toalha-quarto-trecos-carteira-celular-chave-capacete-opatemtambémocontroleremotodoportão-moto-trabalho. Ih! Hoje vou a pé.

Vafor foncirmar preçensa

E não chegar atrasado. Ninguém vai ficar te esperando, ok?

Alucinado

Feito Luzia que luciluz eu me alimento de luz. Mentira.
Feito Luzia que luciluz eu prefiro mesmo é carne vermelha. Vou almoçar.

Todo-dia

Sou um herói medieval de armadura quebrada e espada sem corte. Sou faísca. Mas não fiasco.

Espero que não

Por que?

Persigo as respostas. Cada vez mais distantes. Todos me enchem de perguntas.

Este post está bobinho,
vou tentar começar de novo!


Claro que não dá. Não consigo, não me sou.

Olho pra dentro.

Só uma interrogação pulsando. Seu formato assimétrico de difícil deglutição. O ponto entalado na garganta. Sentimentos rasos.

Olho pra fora.

Todos me fazem a mesma pergunta. A mesma pergunta que eu me faço todo dia. E agora? Como responder sem ferir? Quem vai me emprestar um bandeide?

2.6.05

Álhito

Mãos álhitos e a praga de morar sozinho.

Relógios, temperamentais

O sinal é verde quando todos pensam vermelhar. Ver melhor. O mundo sofre de daltonismo, ou melhor, de jornalismo. Eu curso. Em curso. Discurso.
Cada relógio tem o seu juízo.

Bata, s.f.

Estranhos olhares consumindo linhas. Vontade de ser uma camiseta, uma túnica, uma veste rasgada.

Vontade de ser um trapo, apenas.

1.6.05

Imagens

A luz amarela, a lua amarela, ali amarela, borboleta amarela.

Eu, azul que nem o reflexo da televisão.

No chão, as mentes estateladas.


Na parede a lua sumindo e o sol saindo.

Na parede, não, mas no buraco da parede. Buraco que ontem foi tiro e anteontem foi pedreiro tapando outro buraco que antes de anteontem foi outro tiro.

No presídio, sempre quadrado.


Prefiro um blog, um pênalti perdido, uma ovelha desgarrada.

O sim branco, o som branco, o sem branco. São brancos.

Outro seriado.

Alter ego.

Recipe

Clicar em criar
Claquete
Colocar cada claque em seu lugar
Clarear o clima
Clubificar
Calibrar os colóquios
Cumprir.
Cloaca.

Em frangalhos

Meu coração é um e-mail que não foi respondido. Custa a desaparecer e está empapado cá dentro. Vem a faca, desfere um cortezinho. Vem outra faca, maior, e reparte ao meio.

Tá, meu coração não tem nada a ver com um e-mail que não foi respondido. Agora já está em pedacinhos, e muito sangue jorrando em volta. Em volta não, porque fica incoerente(?); o sangue na verdade jorra de dentro dos pedacinhos mesmo. É, tem um pedaço da aorta também e de outras coisas que eu aprendi na escola mas não me lembro mais.

Aí vem um louco barbudo e distribui os pedacinhos. E todos olham estupefatos.

Eu já era.

Hígido

Na égide que convém, tento dormir o repouso dos anjos absolutos. Mas as garrafas já se quebraram e agora é vodca barata pra tudo que é lado.

- Sic.

31.5.05

Buh!

Cataplof.

30.5.05

Uma lâmpada debaixo do travesseiro

Pra pegar fogo na cama não é preciso mais. Fogo de verdade, com chama e cinzas. Sem ser quarta-feira. Nem domingo, nem pastel de feira. Nada. Nem rissole de carne ou coxinha de frango. Nem pinto duro e morto. Nem cabra-cega. Nem surdo. Nem bumbo. Bomba!

Aliás...

Péssima idéia!

Boa idéia

Samples, e sim.

Só um solo de jazz

Fragmentos de mim
e um resto de esperança,
Faculdade de Vandalismo.

29.5.05

Boa noite

Simples, assim.

Feriado

Eu só queria era entender por que todos os meus feriadões acabam às 16h30 do domingo. E depois é só a saudade.

Conto tudo, não escondo nada

Conto o dinheiro e não escondo a senha
Canto o poema e não esquento a cuca
Cento e vinte reais e esqueço os centavos.

25.5.05

Sol 2

Ele fugiu da minha pergunta, não deu as caras.

Mas eu descobri: é a abreviatura de soluço. Porque soluço rima com lágrimas que rima com todo o tipo de saudade. Inclusive daquilo que se não viveu.

Problema de lógica, de ética, de transição, de nadundância

Há um turbilhão de idéias. Mas dói a garganta.
Procuro respostas em lugares errados.
Era uma vez um velhinho doente. Ele morreu.
E aí acabou a história.

24.5.05

Fotograma

Manhã meio feia. Na ponta do lápis, minha língua desfere mais um poema: outra mentira a se somar às tantas que jazem na gaveta mais próxima.

Sol

Queria saber se Sol é a forma abreviada de solitário.
Juro que amanhã cedinho eu pergunto pra ele.

Posto

De gasolina.

Mas posto pra ninguém ouvir. Posto pra fazer disto a caixa-preta de minhas desilusões e soluços. Incurável.

Cor-de-abóbora

Plantei sementes, somente. Quando fui ver já eram doces-de-abóbora. Pena que não gosto.

Joguei aos porcos, poucos. Quando fui ver já estavam assados com maçã na boca. Pena que não posso.

Lancei no quintal a maçã. Macieira imaginária que lá havia indignou-se prontamente: - Mas como ousa? Além de sacrificar meu fruto, ainda tem a coragem de o refutar? Vai comer tudinho... Ah, se vai!

E me botou de castigo.

Preciso não-dormir

A noite é uma das invenções mais belas da humanidade. Com suas areias do tempo congeladas, exibe-nos estrelas estonteantes e, vez em quando é bom, a lua rechonchuda como as bochechas do Papai Noel, só que menos coradas.

Se o natural fosse dormirmos, pra que é que existiria esse pano de fundo negro tão belo? Ah... Os outros que me perdoem, mas eu quero é ser o primeiro plano desta beleza!

Meu travesseiro que fique com as sobras.

Sobre cronópios e famas

Um manual para viver à toa. Dois manuéis para sorrir atéia. Três menudos para cair no atchim!

23.5.05

Casa do Ó

As maluquices meio que loucanizam os olhares. Licores. Laços. Vaga-lumes luciluzindo em todas as esquinas. Um retrato pra alguém nunca mais olhar.

Suéter

Molhado dependurado no varal. Aquele da matemática. Aquele do tempo em que eu era ilusões e me perdia na trigonometria analítica.

Um prendedor, uma bolha de sabão. Dentro da bolha um menino iridescente, sorrindo só no canto da boca, cigarro entre os dedos. Depois ele pára de sorrir. Depois ele sussurra o mais alto que pode, no limite onde o sussurro quase se deita e deixa de ser sussurro pra se tornar gritinho histérico:

- Ahahaha! Eu vou queimar a bolha de sabão com a brasa do cigarro! Ahahaha! Eu vou me libertar daqui! Eu vou me vingar de vocês! Protejam suas filhas, seus viadinhos! Protejam-nas porque eu as projeto!

Fragmento sem juízo

Antônio era antônimo de íntimo. Antigamente. Não por ser anônimo, mas por ser entrega. No óbvio que evitava, avistava a inveja:

- Tão abismada...

22.5.05

Princípios

Neste blog, tudo o que eu não quero é um patrão que não seja eu e um padrão que não seja meu.

Aqui exercerei minha postura autoritária e não me importarei com ordens supremas.
Será meu quarto. Ou melhor: meu banheiro.

Não estou com a mínima vontade de me dirigir ao leitor, por mais presente que ele seja. Abaixo às regras de emissão-recepção. Está provado, por experiência própria, que elas se tratam de permissão-decepção.

Meus princípios são os fins, neles mesmo, deste blog.

Se amanhã eu cansar, fecho de novo.

Aforismo

Errou quem disse que as pessoas são engraçadas. As pessoas são é desgraçadas.

Esquete sem graça

Era dia de semana quando o cinema disse: em cena!

Aí os patos todos desandar a correr rumo ao mar, mas o mar era maior, o mar era de moer!

Então eu acordei e gritei pra todo mundo ouvir bem algo, bem alto: CATACABANA! CATACABANA! CATACABANA!

Incrédito

Custou, mas hoje descobri que a esperança morre de soluço e o sol não nasce de desgosto.

Custou, mas eu paguei.

Egotrip

Passo as tardes desobstruindo os mecanismos criados para auto-satisfação. Depois volto pra casa contando as estrelas que escorregaram e viraram paralelepípedos do caminho. Aí percebo: os caminhos são todos intransigentes mesmo!

Ensaio para uma Oração

Maremoto ou destruição?

Olho para o horizonte e não percebo o que está nem onde.

Liga não. Isto de não ter ninguém no caminho só pode ser uma rede balouçando vazia. O resto se inventa, se vinga, se viceja. Amém.

Loucubrações

Como estão as coisas quando o mar está estranho? As uvas, a chuva, o momento e a água...

A cura nunca há mais, senão a dor pela saudade do que nunca foi direito.

Saudade? Não... Não há cura que destrua o saudosismo. O resto é história. Por enquanto há só a morte das lembranças amargas.

Morrem sim. Junto com a esperança: sensual e etérea vicissitude dos que se afogam nela.
Hoje o dia está assim. Esquálido.

Não há salvação por trás do texto.
Pensando bem: não há salvação na frente também. Não há salvação no nexo, tampouco no contexto. Que é que somos?

Ao espelho

E diga-me, o que fomos ontem se nada estávamos por dentro de agora? Diga-me...

Mente Oca

No silêncio sai o cio nervoso das palavras que hoje não quero escrever. Xô! Assim a sina persegue e a vida segue cega na invirtude efêmera dos não-seres.

Definição

Quando descobri que os seres humanos não vinham com manual de instruções, deitei a cabeça no travesseiro e chorei por mais de duas horas sem parar. Depois voltei a mim e passei a encarar o mundo do jeito que as coisas se me apresentam mesmo.

Quando descobri a inexorabilidade da Lei da Gravidade, primeiro fiquei com raiva, depois fiquei com uma inveja desgraçada desses vereadores celestiais que podem tudo com suas leis que jamais serão revogadas nem sob Medida Provisória.

Quando desperto de meus sonhos, sempre acho que a vida vale menos a pena.
Mas, mesmo assim, continuamos com nossas dúvidas e inquietações. Que são o que nos movem, não é mesmo?

Voltei...

Sou o passado em discussão. Sem nexo, sem obrigatoriedade de salvação, sem senão. Sou o passado estampado na vidraça do vizinho, o poente cravado na montanha de anteontem, a ponte que atravessa o nada para o lugar algum. Sou o vazio.