31.12.06

Medo de a bancada desbancar.

20.12.06

Esboços de uma estação passada (vol. último)

Pronto. Agora é só botar minha vida na mala e voltar pra Bauru.

Um babaca de nariz adunco - que conheço de vista mas não sei o nome - me interpelou hoje, aí pelas 11 horas da madrugada. Primeiro tirou um sarrinho do tamanho de minhas barbas, com uma daquelas piadinhas medíocres.

[SEMI-SONETO TOSCO, SEM MÉTRICA NEM RIMA PORQUE PÓS-MODERNO]

Todos os linques estão quebrados
Todos os imeios retornam ao servidor
Todos os saites foram invadidos
Todos os computadores acordaram com bug

Todos os bológues estão desatualizados
Todas as romipeiges foram desativadas
Todas as figuras não carregaram
Todos os arquivos atachados trouxeram vírus

Todos os messenes se perderam no ciberespaço
Todos os modens queimaram com a tempestade
Todos os contatos foram deletados

Todos os arquivos FTP viraram pó virtual
Todos os favoritos simplesmente sumiram
Toda a internet foi brincar de rede de dormir.

Pra não dizer que não falei dos ursinhos inocentes e sem vida que resplandecem nos quartos das meninas bonitas:
Muda-planta pra cidade-muda onde me mudo
Na cidade onde ninguém sabe falar eu também me calei.

Linhas recheadas de línguas
Tec-tec-tec-tec-tec. Teclando. Entre bits e bytes minha língua míngua ou ainda deságua porque a língua não se acaba?
O guarda-língua assustou-se quando descobriu que a língua é uma grande metamorfose. Mas a língua, espevitada e linguaruda que só ela, não se fez de rogada: deu uma de Emília, mostrou-lhe a língua e virou as costas.
Tec-tec-tec-tec-tec. High-tech. Século XXI d. C. Depois do Computador? Não, ainda não. Apenas, depois de Cristo. E o mundo já nos veio pronto, estruturado, organizado linearmente como se nem coubesse um hipertexto nem pedacinho de poesia.
O guarda-língua ficou tão sem graça que decidiu fugir rapidamente para o meio da guerra. Dizem as más-línguas, todas vermelhas e grandes, que ele fica lá deitado o dia todinho, esperando que alguma bomba colorida acerte sua cabeça e exploda sua língua junto. Enquanto isso, deixa a barba crescer em pensamento.
Tec-tec-tec-tec-tec. Trec. Se o computador quebrou, não tem mais tec-tec, mas ainda há toda a piração que nunca se sabe se é ins ou trans. Porque é urgentemente preciso des-ser o que sempre fomos e sub-ir aonde sempre fomos.
O guarda-língua, casmurro, taciturno e sorumbático, irritou-se com a lenga-lenga da guerra. Entre fogo cruzado, pisou na pedra mais alta e pontiaguda e desatou a gritar.
- A história da língua é tão longa quanto a língua da girafa. Ninguém chega num acordo, mas não vale a pena brigar, já que as espadas seriam línguas afiadas.
A língua é apenas um rótulo de maionese que colamos para poder viajar nas coisas? Puro convencionalismo que nos ajuda a perceber o mundo tal e qual ele nos parece? Ou a língua nasce do mundo de maneira natural e assim suas palavras estão diretamente relacionadas ao seu significado?
No fundo o importante é cheirar os frutos e comer as flores. Inverter e subverter os paradigmas. Trabalhar nus. Depois todos caímos na mais profunda modorra, pensando sabermos a verdade e curtindo a estranha mentira de nos acharmos felizes. Talvez o importante mesmo da língua sejam os beijos.
(Alheio ao processo lingüístico, um garotinho ficou espantado ao ver o tamanho da língua de boi dependurada no açougue. Com o impacto, mordeu a língua.)

Hoje não tem poema
Porque eu não consegui fazer o soneto que queria.

Uma carta doutros tempos
[achada entre meus arquivos de computador, uma carta que foi escrita há quase três anos]

Taquarituba, maio de 2001.

Século XIX. Dois anos depois de Auguste Comte ter afirmado categoricamente que jamais o ser humano conheceria a composição das estrelas – e isso era um conceito que iria provocar para sempre a existência da humanidade –, Gustav Kirchhoff inventou o espectroscópio, assassinando a idéia do seu contemporâneo. Logo depois, o jovem Albert Einstein divertia-se na escola Politécnica suíça, imaginando um dia viajar atrelado a um raio de luz.
São meras coisas. Fatos banais talvez de um dia que não nos chega ou já nos passou. Que importa? Marcas do que se foi e do que nunca será... Queria ser estrela para morrer e me tornar gigante vermelha, agonizante, depois morrer mesmo de verdade, anã vermelha, anã branca, anã negra, buraco negro, um buraco na parede, corpos selvagens...
Século XXI. Você me pergunta o que tenho feito. O que faço? Penso, logo existo; existo, logo penso. Isso não é resposta que se espere de um cara da minha idade com a nescilidade que me é característica primária. Quem sou? O que faço?
Faço poemas, mentiras, retratos, estranhos esboços. Pinto um quadro que não é surreal nem traça os sonhos do mundo. Às vezes, dormindo, ouço o repicar dos sinos da igreja e penso no racionamento de energia. Às vezes, dormindo, finjo que estou acordado para ver para crer para se ver, para te ter no fundo em meus braços num longo abraço de não mais saber.
Você já olhou para a lua com os olhos que lacrimejam paixão? Já encarou a face estreita que parece conter São Jorge e sua prosopopéia dragão – o dragão carrega em seus ombros o peso dos desvarios de toda a idade da raça humana.
Devo estar chato hoje. Mas pensei em te escrever justamente depois de ler que “o inferno são os outros”. Só Drummond acreditava, em meio a um oceano de filósofos pessimistas, que a convivência é boa, é proveitosa, é divertida – qual era mesmo a palavra que ele usava, sábio? não me lembro, não sei, minha cabeça está à toa...
Devo estar chato hoje. Desculpe-me; juro que não tinha a intenção de te aborrecer tampouco de ser inconveniente. Apenas queria desabafar, e o papel tem aceitado essas coisas medíocres que escrevo na vastidão incólume do giramundo vastomundo raimundo imundo (se o mundo fosse raimundo seria uma rima não uma explicação).
Devo estar chato hoje. Renitente, sem saúde, não estou tributável. Tinha vontade de comprar conhecimento na lojinha de 1,99, mas lá não são vendidos livros. Que pena, amor, que pena. E pensar que a saudade é diretamente proporcional ao avesso da simetria que nos prende e nos confunde... E pensar que somos tão jovens... E pensar que sequer pensamos direito.
Devo estar chato hoje. Esse meu discurso não servirá para nada. Será mais uma carta que passará por suas mãos e será arremessada pela janela – defenestrada – ou, pior, encestada na lixeirinha do banheiro.
Devo estar chato hoje. Deve ser a saudade, o clima gélido... o cheiro do seu perfume que imagino em minhas narinas como se você estivesse ao meu lado agora... Mas você não está... Por que será?
Beijos do perturbado chato.

Idiota mesmo sou eu que fui reinstalar minha impressora e, por falta de atenção, acabei deixando-a em alemão. Então que sou supreendido por mensagens deste tipo:
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Vocês não têm idéia de como isso me deixa feliz.

Trechos
de umas coisas que ando escrevendo

1) Mas para que ninguém saia por aí pedindo o dinheiro de volta, dizendo que “como assim o protagonista morrer bem no comecinho?”, eu vou mostrar as duas linhas que eu escrevi antes de morrer:

Decidi que não quero ser felizinho.
Agora vai ser oito ou oitenta: só brinco se for feliz ou triste.

2)
– Que cabeça você quer?
– A mais bonitona e cheia de recheio por favor!
– Serve Ezra Pound?
– Não sei... Preferia algo nacional... Tem Clarah Averbuck?
– Tem mas acabou. Por que você não leva Leminski?
Tudo. Tudo. Menos o tem mas acabou. Odeio o tem mas acabou.

3) Tinha cinco dedos em cada uma das mãos. Não era, portanto, presidente. Falava inglês, alemão e não-sei-mais-o-quês. Amava cinco namoradas, sendo fiel a todas elas. Era doutor em embromations factus e ganhava 15 mil dólares por mês. Andava sempre num carro importado, que não sei a marca porque não entendo de carros. Bebia só uísque escocês e ria dos pobres para quem jogava esmolinhas com desdém.
Um dia, tropeçou no ego e morreu de traumatismo craniano.

4)
- Manhê! Manhê! Manheeeeeeeeeeeeeeeeeeê!
...
- Mãe!?

O mundo anda bem doidão. Parece que fumou uns três quilos de maconha e agora bateu uma larica desgraçada nele. Então começou a devorar pessoas, umas com quéti-chupe, outras com queijo ralado. As mais rechonchudas, in natura mesmo.

Você já experimentou conectar dois caleidoscópios, um diferente de outro, um em cada olho, ao mesmo tempo? Experimente: talvez seja o melhor jeito de se lembrar de esquecer que o mundo não está mais valendo a pena.

Antes que alguém me pergunte: Não, o inferno ainda não voltou a funcionar!
Eu? Sou só um cara sensível tentando compreender a dureza do mundo.
Não, não estou bem. Acho que estou pirando. Sábado sem graça e, agora, prenúncio de um domingo indigesto.
Não sei o que vou fazer. Mas alguma coisa grande pode acontecer.
Vou-me embora da Terra dos Emboras?

Embora o Governo não saiba contar direito até dez e nos obrigue a manter o equilíbrio na ponta dos pés, o Brasil vai caminhando; embora a Televisão mo-dele a pública opinião e padronize até mesmo o nosso coração, há nichos de resistência criando novas formas artísticas; embora nossa escola venda um saber sem sabor que nos atola e nos restrinja a um universo sem verso nem de esmola, cresce o número de interessados por uma educação de nível superior; embora a nossa seleção de futebol ande capengando no cenário mundial e jogando mediocremente faça chuva ou faça sol, o povo não perdeu o amor pelo esporte; embora não haja uma política de incentivo suficiente para um ativo processo de revitalização do que outrora foi cenário de gláuberes e as blockbusters pasteurizadas por americanismos sejam abundantes, o nosso cinema está renascendo.
Embora não tenha cumprido sequer as promessas do vento da campanha, o presidente ousa prometer que vai fazer muito mais do que promete. E a fo-me? Zero é a nota que sacode no prato vazio do faminto que, embora tenha confiado seu voto ao ex-metalúrgico, ainda não viu realizado seu sonho do pão-nosso-de-cada-dia. Embora a realidade para ele seja triste, amanhece ca-da dia com força para trabalhar em busca de sua utopia.
Embora o frio esteja chegando bravo este ano, os sonhos continuam quentinhos dentro do peito de cada um; embora ao passarinho custe migrar porque grandes são as distâncias, sabe que no final de sua trajetória um porto seguro encontrará nos braços de sua amada; embora a dor e a saudade sejam incomensuráveis e cutuquem o amargo âmago feito piercing que não se perce-be, reside na alma o consolo de novo reencontro e tantos e tantos e tantos e quantos forem e houver.
Embora todo adágio pelo uso seja gasto e não passe de lugar-comum e a língua tenha se tornado cada vez mais comum com o baixo nível de entropia cultural alçado pelo povo, é preciso dizer que quem canta seus males apronta, que antes só do que mau no mercado, que em terra de cego quem tem um olho é gay, que quem com ferro fere com ferro será fedido, que se conselho fosse bom eu te vendava e ventava porque quem semeia vento colhe solidão.
Embora haja tantas ironias no seu dia-a-dia e tanta desilusão na sua noi-te-a-noite, note, o brasileiro não perde a esperança.

Bom dia, sol!
(Mas a janela vai ficar fechada porque eu não quero te ver não!)

Vazio como meu dia.
Vem uma dor aqui. Triste.
Talvez.
E o sol nascendo é tão bonito, tão diferente da tristeza que toma conta de mim, que às vezes tenho medo de preferi-lo ao poente, de inverter assim minha vida como se não houvesse.
O que que tem atrás da porta?

Sentado em um sorriso indefeso, ponho-me a observar as pessoas que não sabem voar. Elas são tapadas e não me vêem aqui do alto, enquanto eu procuro minha escova de dentes para continuar defendendo meu sorriso.

Eu ando com raiva da chuva.
Eu vou fugir.

Eu fico aqui torcendo pro meu ventilador, 24 horas por dia trabalhando, não pifar. Senão, como irei terminar de criar as infinitas vidas?

15.12.06

Eterno retorno

Nada criativa, a história se repete.
Lula chora ao ser diplomado e vai rir por outros quatro anos.
Nós assistimos. E teremos quatro anos para continuar com os prantos.

A única diferença é a sujeira acumulada no currículo do presidente.

13.12.06

Tudo o que sobra é o espaço entre nós
Tudo o que falta é abraço

12.12.06

Desconto de Natal

Durante o ano todo, ele se comportou direitinho. Seguiu todos os dez mandamentos, inventou outros três, respeitou mais alguns. Nem era cristão, mas achou melhor não brincar com essas coisas. Também deu provas de cidadania: jogou o lixo no lixo, não andou na contramão, não fumou no elevador, ajudou as velhinhas decrépitas a atravessarem a rua e, principalmente, não sonegou o imposto de renda. Ah, o imposto de renda.

Seu bom comportamento valeu até no futebol com os amigos - não foi desleal em nenhum lance e resistiu a quebrar os tornozelos do atacante adversário mesmo quando este sobraria cara-a-cara com o gol, goleiro já vendido - e no de verdade, quando no estádio não xingou a mãe do bandeirinha corrupto e nem pediu a cabeça do técnico do seu time, mesmo perdendo de 4.

Tratava os funcionários de sua fábrica de brinquedos a pão-de-ló, como se diz. Ganhavam bem, comparando-se à concorrência, recebiam décimo-terceiro, décimo-quarto e décimo-quinto salário, tinham tíquete-refeição, vale-transporte, cesta-básica, o escambau. Em casa, era um marido exemplar: cobria a mulher de afagos e mimos, nunca falhava na cama.

Pensou que por ter sido um bom menino mereceria um belo presente debaixo da árvore. Quase esqueceu que era ele o Papai Noel.

7.12.06

Esboços de uma estação passada (vol. 5)

"Os pássaros voam porque não têm ideologia"
(Millôr Fernandes)

Tudo o que eu queria agora era fazer um grande poema de amor
mas não acho poema pra tanto amor!
Eu ia falar uma grande besteira, só o naco de sensatez que ainda me existe pede pra deixar pra lá.

Resto de madrugada. Eu sem grana, procurando um novo buraco pra me esconder da chuva.
Descubro-me misântropo de última hora.
É sempre assim quando a noite começa e nada termina é sempre assim esse gosto de sem gosto agosto na boca e a secura de não te ter ao meu lado nas noites tristes é sempre assim mesmo porque não há salvação fora daqui nem dentro daqui não há salvação em lugar nenhum é tudo ilusão e toda ilusão é passageira porque isso eu aprendi desde pequenininho.

Pra falar a verdade eu nunca havia pensado nesse negócio de que todas as meninas amam as estrelas
Agora estou até com medo
Medo
de perder um ou outro dedo na conta insaciável dos astros do céu
seu céu
meu céu
céu

Pra falar a verdade eu nunca havia pensando que pensar demais podia doer um pouco
agora começo a bater cabeça
cabeça
cheia de idéias novas e sonhos velhos comprados no supermercado
próximos da data
do vencimento
Vem, cimento: concreta tudo o que se desfazia no ar!

Vi um relógio escorrendo de um galho e pensei que estava perdido dentro de um quadro de Dalí. Mal sabia eu, pálido ignorante, que aquilo era um pé de tempo e o que escorria era um fruto apodrecido porque não colhido no tempo certo.
Decidi mudar-me para um quadro do Escher. Ao menos seria mais divertido escorregar na perspectiva.

A mentira da forma como ela acontece:
- Legal né?
- O que?
- Tudo!
- É...

Descobrimento do Brasil: A terra, ninguém prometeu, ninguém cumpriu. Caminho entre pedras e vejo surgir cidades cheias de gente feliz e cores verdes, amarelas, azuis. Olho pra dentro das casas, pelas janelas que me sorriem, e o que são lá dentro senão faces me vendo alegres com as cabeças cheias de pensamentos de algodão-doce...
No país do meu sonho, todas as construções se esfacelam no ar. E dá pra sentir no vento tudo o que as pessoas sentem. Sabe quando a gente pega a casca de laranja e espreme, sai aquele sumo que nem um vaporzinho brilhando contra o sol? Assim, assim. Dá pra perceber o sentimento das pessoas como se fosse sumo de laranja.
Piso o chão. Mas piso bem de leve, para que ele não grite, não reclame, não doa. E vez em quando saio pra colher estrelas, enquanto a lua fica observando todos nós. As estrelas têm o jeito estranho de serem todas serelepes, enquanto a lua é rainha onipotente, clarão clareando tudo, esclarecendo o ser, esclarecendo a vida com sua magia de ser.
Aqui não tem pobreza, não tem fome. Não tem ignorância, não tem analfabetismo. Os livros pululam livres das estantes, e o que era antes senão somente instantes de sabedoria?
Meu país ainda vai ser descoberto.

Decidi que não quero ser felizinho.
Agora vai ser oito ou oitenta: só brinco se for feliz ou triste.

Considerações

Para errar com estilo, é preciso aprender, é preciso saber. Nada de estuprar a sorte ou convencer a fortuna. Para errar com estilo, é preciso soerguer as sobrancelhas e evitar qualquer golpe que vier a ser desferido.

6.12.06

Esboços de uma estação passada (vol. 4)

Vou chamar a polícia e o ladrão.
Minha mãe também virá.

Dormi hora e meia. No meu sonho tinha um revólver verde e quase enferrujado com o qual eu matava todas as pessoas chatas.
Matei-me.

Taquarituba, 21 de julho de 2003.
Pensando em toda a maluquice desta pós-modernidade na qual vivemos, sabendo-a efêmera e triste, embora recheada de pontos de felicidade - provocados por compostos físicos e/ou químicos.
Pensando se não é mais fácil jogar tudo pra cima e desistir. Certo de que é mais fácil, decido continuar: sempre optei pelos caminhos mais difíceis.
Pensando na imensa delícia de ser o que é. Pensando em pensar só mais um pouquinho. Apenas pensando.
Como será o próximo semestre que por aí vem? é sempre esse gosto de ansiedade e esse sabor de sorvete de laranja na boca. Alguém já tomou sorvete de laranja? Por que?
Estranho, né? Mas já dizia Shakespeare: "Há mais razões entre o céu e a terra do que sonha nossa vã filosofia".
Só. Acabou o papel.

fico aqui pensando e me lembro que você já me matou.
quando acordei vi meu corpo estirado junto ao seu. um pouco de sangue misturado ao resto de vinho. ambos mortos. primeiro eu, com um punhal no coração. depois você, com um suicídio na cabeça.
o amor tem dessas coisas.

Não adianta nada, não adianta nada.
No fim ninguém vai mesmo sair vivo desta história, desta histeria, este game-show sem graça no qual estamos imersos. Eu e você + todo mundo. É, minha nega, você também vai morrer!

Vou escrever compulsivamente, o que significa ficar horas, dias, semanas quiçá, a fio, teclando e bebendo, bebendo e teclando. Poemas, cartas de amor, problemas, crônicas, contos, tudo, tudo, tudo...
Vou escrever até morrer de cirrose hepática, aids ou lesão por esforços repetitivos mesmo! Vou escrever até ficar com a ponta dos dedos ensagüentadas e ela possa então colher a poesia que brota dos meus dentre unhas.
Ninguém segura. Senão me explodo!
Pode reclamar. Foda-se.

mundo moderno
pressa. pessoas passam.
posso? pode não,
aqui é sob pressão.

a pedra ronca?
não. é só o mar
que quebra.

Talvez porque minha costumeira indisciplina e essa preguiça macunaímica nunca me permitam cumprir sequer metade do que planejo. O fato é que até agora não li o tanto que havia imaginado ser capaz.
Além do mais, o violão continua encostado praticamente da mesma forma como o encontrei - como se por si só ele fosse fazer música ou mesmo aprendê-lo.
O calor é grande: ontem fui pentear os cabelos estabanados do sol e quase virei Ícaro; só não me converti em energia porque ainda não compreendemos muito bem aqueles papos do Einstein.
E o que mais me incomoda, incomoda de doer, é a total secura de inspiração. Eu, rodeado de páginas em branco, branco em páginas e na cabeça, produzindo pouco, pouquíssimo.
Até agora nenhuma carta dela.

Você já tomou chuva hoje?

Você dorme de meias?

Por que perdi assim o caminho do seu coração?

Você está com frio? Por quê?

Abro e cadabro meu coração: I need somebody to love, de verdade, não esses amores made in Taiwan que se locupletam com um sorriso falso e não entendem nada das coisas da vida.
Eu quero a poesia dos instantes e, acima de tudo, quero voltar logo pra Bahia porque a Bahia é o que o Brasil tem de bom, com exceção do Antonio Carlos Magalhães.
Tem dias que a gente é como que nem sente, passa feito nuvem e vai chover lá longe. Aí o sol se apaga feito vela de pavio curto e não sobram duendes pra colher o ouro porque nem arco-íris não há mais.
Onde está Wally?

Qual é a cor do céu azul?

Você confunde concorrer com correr? E confundir com fundir?

Véspera do nascimento. Vento. A chuva que molhou seu onde com lágrimas de felicidade só agora chegou a Taquarituba. Culpa do fuso horário ou do confuso andar dos dias na mente de Deus.
Véspera do nascimento. Execução da pena capital de todos os perus, leitões, panetones e outras flores e trevos de Natal. E Papai Noel, coitado!, vestido de coca-cola, vertendo suor por baixo de suas roupas nórdicas e suas barbas de algodão. Ainda se fosse algodão-doce...
Uma carta sua chegou-me - misto de alegria e desesperança crescente.
Mas isso não é importante: o mundo vai continuar sua vã existência.
Há uma alma em mim desgovernada como se dentro de um carro em alta velocidade eu risse cínico do perigo deletério de viver.

Não é perigoso ficar navegando na Internet?

Mais uns dias por aqui. Olhar fotográfico perscrutando o dia, os dias, dia-a-dia. Diáspora, eu diria, velhos amigos espalhados por esse espelho estranho chamado vida.
Subo pra colher a brisa do ar e cato um pouco de poesia no seu olhar. Só olhar, mais nada, nem alma, nem nada, mais nada.
Abro o guarda-chuva e salto lá de cima.

Sorvete de baunilha é gostoso?

Foi quando a beleza veio me visitar, irisdescendo meus olhos e dando novo alento às minhas retinas tão fatigadas. Veio num corpo ainda adolescente e tinha dois olhos castanhos que não me cansei de olhar melhor. Suas melenas escorriam pela face - o que tristemente impossibilitou o toque de meus lábios no beijo usual de recepção e despedida.
Pensei que viesse para ficar, ao menos uma noite. Mas não: almoçou e foi-se embora deixando para trás um suspiro já calejado de tanto perder as esperanças.
Na noite do mesmo dia conheci a versão safada da beleza. Uns dezessete anos, mas muito vivida, louca para me ceder os prazeres mais deliciosos da carne, trêmula carne que tanto gostamos. E usava saias que praticamente facilitavam a tarefa.
Day after: sorvete de acerola com gosto de saudade e overdose de Lula na TV. E eu torcendo para que a terceira menina, o terceiro olho da cara, a terceira margem do rio, me entenda, pois só ela é capaz de, em sua distância de onde está, sanar a sensaboria de meus dezoitos anos.

Você já nos mandou um vírus hoje?

Uma coisa é correr, outra é socorrer

Uma coisa é escorrer, outra é escorregar

Uma coisa é crescer, outra é ficar velho

você já levou seu cão pra passear hoje?

1.12.06

Do poder

quem pode, chove
promovento
e os piores são
pirados
onomatopaicos.

conto, canto,
estrelo os dedos
e, em cada estralo
que estremeço, moça,
jogo os dados,
arrisco, arisco,
uns degraus da vida
- de grau em grau,
meço a dádiva
da dúvida
e choro,
em dívida.

quem pode, gasta
eu gesto
no gosto
eu gosto
e me enrosco em pernas
que não são minhas
e me aninho em perdas
sempre tão sozinhas
e me atiro pedras
pontiagudas,
ferinas,
pesadas.

quem pode, interroga,
exclama,
reticencia, ri.
eu só ponto-finalizo.

Perdição

Com vontade de passar sua vida a limpo ou esticá-la sob ferro quente, não dormiu hoje. Ficou contando letrinhas do Notepad.

Seus sonhos, há muito vendidos, embaralhados.