24.11.05

Pra blogar hoje

Não sabia onde encontrar tal destino, tal sacolejo de ônibus, tal nada. Era um andarilho sorridente:

- Dê cá este texto pra eu testar.

E assim começava a diagramação de mais um livro, livre.

21.11.05

Café

Um caroço esmagado na cabeça não garante o trabalho da pressa tampouco o ritmo da crença ou o fruto partido ao meio.

Meio? Que meio?

O mesmo que falo e assumo, aquele que choro e me perco, o sim que sussurro e simples mente.

19.11.05

Estar

Concebi duas vidas de aniversário e as plantei sob a sombra do fio varálico. Do varal. Pra ninguém mais achar meu celular nem se esconder debaixo do tapete.
A vida é um trapezista de pernas tortas e grandes e feias, pronta para devorar as rebarbas do planeta. "Corre que lá vem a cor neón", grita. E depois sai anunciando aos profetas que ninguém jamais vai ser surrado com o soco inglês de madame Ali Walla Ali.
Comecei comendo um bombom. Juntei as embalagens para brincar de televisãozinha. Cuspi tudo.
Quando crescer quero ser uma TV de 29". Minto: quero ser um espirro, um jorro, um espasmo.
Quando crescer quero ganhar um presente de dia das crianças.

17.11.05

Sins

Como se fosse possível apunhalar o próprio umbigo, defenestrou-se rumo ao abismo.
Respirava o ar impuro dos pusilânimes e fracos. Não sonhava, não se sabia, não era.
Em dias de escuridão, brincava de inventar estrelas.
No inverno, saía para colhê-las. Jamais conseguia, não as encontrava.
Era todo de negações. Negava até o não.
Em vinte e três de maio de dois mil e seis, alguma coisa vai lhe acontecer.

15.11.05

feriado

é para os fracos,
assim como ferido é para o frasco.

14.11.05

Lamúria

Rima bem com desespero, dor e falta de ar.

10.11.05

Ilusão

na verdade
isto aqui do dobro
não é nem a metade

uma perna bamba
na corda quebrada
que brada:
olha o tombo!

se virar pelo avesso
dois sóis
que despeço
adeus!

9.11.05

Com suas asas brancas, o demônio domina molduras estereotipadas e, livro na estante, brinca de quebrar instantes.

Solo.

8.11.05

O trepador emérito

Apolíneo gabava-se para todas as mulheres: ninguém melhor que ele para alcançar as frutas do alto da mangueira.

7.11.05

Valfrido é um fingidor

Palhaço de mentira, seu trabalho era rodopiar em público. Abria um braço, outro, equilibrava-se na memória e depois fingia escorregar. Escorria. Nunca experimentara o tombo dos inexperientes.

Seu nome era Valfrido, e todas as suas irmãs costuravam palavras nos livros velhos da biblioteca municipal.

6.11.05

Economia

Faz tempo que não tem pedra no meio do caminho. O prato quebrou, mas os cacos não machucaram ninguém.

Dentro, um túnel.

3.11.05

Apenas um suspiro sem explicação nem vontade

Trafegar era aquele exercício de ninguém mais. Da montanha ao céu, do céu ao abismo, do abismo à morte.

Caudalosa, ficava imaginando quedas e pensando um dia se tornar cachoeira. A vida não é pra sempre e as quimeras também morrem derretidas.

2.11.05

Finados

Feriado nublado
Mesmo no trabalho.

1.11.05

Buriti

As mesmas árvores que avisto
Aviltam o verde nu
folhagem
arabescos
absurdos

Quando eu crescer quero trepar no alto da palmeira
só pra escorregar
infinito
rumo ao tombo.