10.10.08

Blém-blém-blém, doze vezes, e num átimo já não era mais meia-noite pois o tempo não pára. E ouvia ela assim, insistentemente, o repicar do sino anunciando o fim de mais um dia, rotina, mesmice. Mas será que o sino existia ou tudo não passava de desvario seu? Pois se sino não havia que é que repicava e repicaria blém-blém-blém quase sem querer? E se fosse o mesmo sino que ela não sabia que existia e repicava perfeito para estender o som da marcha fúnebre às sextas-feiras, pontualmente cinco da manhã? Aliás, não se via capaz de entender o porquê do lúgubre ruído deveras por causa de seu pensamento no som da trombeta anunciando renitente a morte de alguém. Por que isso a lembra da morte dos grandes soldados na guerra, deixando-a triste na vaga lembrança daquele vulnífico tanque de batalha na fazenda do avô? Para que dele lhe servia o avô? Apenas para alimentar as traquinagens dela e seus primos que cometiam afoitos diante do bélico instrumento? O eco do blém-blém-blém não respondia, era só silêncio, e ela audaciosa e melindrosa se encolhia toda na cama quentinha só de pensar nessas bobagens que chegam até a tirar o sono da gente. Afinal, que ia ela de querer com o sino que repica, o vento que chacoalha, a voz que estremece? Investigar o instigante motivo que levaria o sino a trabalhar altas horas da noite, incessante, mesmo que no mesmo instante exato todos dormimos como juliãos descansados? Não, não, apenas uma coisa tinha certeza: ela, e só ela, sabia conversar com estrelas. E sabia que sabia, isso era melhor ainda, pois a consciência a revestia de talento e a fazia umquê mais forte. O resto? Conquista-se, compra-se, vende-se... Falar com estrelas, só ela, mesmo quando no céu não há mais estrelas, mesmo quando é dia e o Sol estrela maior egoísta se sobrepõe às demais e apaga o que não é tão claro como ele. Pois sabia bem até procurá-las na claridez e as encontrava mormente, mesmo aquela que menos brilha, aquela que julga como sendo sua, só sua.

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