3.12.07

dos gnomos cor-de-abóbora

É cada vez mais inusitado tentar compreender a natureza dos gnomos cor-de-abóbora. Seus fluxos migratórios, sempre menos constantes numa progressão geométrica, são um desafio à nossa própria convicção racional de ver o mundo com a arrogância antropomórfica – chamamo-nos às coisas: boca do céu, pé da mesa e pé de limão, garganta de terra, seio de mar, língua do envelope, dente do serrote e dente do pente, braço de mar também, e assim por diante. Antropogeodésicos.
Pois bem, sem tergiversar muito, voltemos às nossas estranhas criaturinhas. Ainda há pouco, dois gnomos sambavam voluptuosamente pensando ser carnaval mesmo em agosto. Realmente fogem à nossa capacidade de compreensão, rotundamente pusilânime. Outro, que nos parece ser o mais tímido de todos, se escondeu atrás da hélice do ventilador. Experimentamos ligar o ventilador e pudemos contemplar o gnomo num vôo digno de Ícaro. Infelizmente o tombo foi grande e acarretou a ele sérias complicações médicas, obrigando-o a ocupar um leito velho do deficitário sistema público de saúde. Segundo Dr. Koch, só terá alta em, no mínimo, 45 dias. Os seis restantes foram por nós flagrados numa tentativa de suicídio coletivo. Diziam que a existência mundana não valia a pena nem cabia apenas e melhor mesmo era que reencarnassem em forma de estrelas anãs brancas, segundo uma crença tradicional deles. Não deixamos, porque acreditamos que tal escapismo não é conveniente à evolução de nossas pesquisas, ao menos antes de fazermos a nossa taxionomia. Estamos, por certo, considerando mesmo a possibilidade de matá-los, se assim for preciso, a fim de evitarmos uma série de atos suicidas que, por assim dizer, não se coadune com nossos princípios estéticos, éticos e religiosos.
O trabalho diário com gnomos dessa espécie cor-de-abóbora nos reserva exóticas surpresas. Um deles, por exemplo, do grupo dos suicidas, já avisou que a partir de amanhã pretende entrar num livro do Bukowski. Qual livro?, perguntamos, e ele respondeu que tanto fazia[1], desde que ele pudesse manter certas relações escusas com os versos e, num momento mais profundo, com as palavras. Preferimos não especificar aqui a natureza de tais relações porque temos receio que este relato possa vir a cair em mãos de pessoas de família e não pretendemos provocar ruborizações de tipo algum em ninguém.
Por fim, encerramos com este parágrafo o presente documento. Não porque acreditamos ter atingido o pleno e satisfatório rendimento em nossa pesquisa e, por conseguinte, esgotado aqui o assunto. Na verdade, encerramos aqui porque já estamos com preguiça de continuar enchendo o papel de letrinhas nem sempre calcadas na verdade. E, ademais, se os gnomos perceberem que estamos descuidando deles um minuto que seja, ficarão tristonhos e revoltados. Às vezes até risco de fuga haja.

[1] Depois de uma sessão de tortura, ele confessou espontaneamente que, apesar de tudo, preferia que o papel fosse cuchê.

2 comentários:

Anônimo disse...

Estou a procura de alguém que me ensine a postar fotos no blogspot.

Encontrei você no google.

Me ajuda aí brother.

Anônimo disse...

"Experimentamos ligar o ventilador e pudemos contemplar o gnomo num vôo digno de Ícaro" - sensacional a cena... é quase um roteiro hollywoodiano. Quero comprar os direitos!