19.1.09

Pá lavra em vento (devaneios sem nexo)

*Dedico à famigerada Thaís, que de tanto ler Guimarães Rosa é bem capaz de já sabê-lo de cor*


Como vovó já dizia, quem semeia vento colhe tempestade. Mas quem semeia em vento, feito pensamento, fica só com a saudade do que nem foi porque não brotou.

Que palavra invento? Espalhadas pelos espelhos de dentro dos pedaços de minha cabeça, queixas invejosas são direcionadas ao famigerado Guimarães Rosa, homem poema-prosa: fasmisgerado, faz-me-gerado, falmisgeraldo, familhasgerado...

Que palavra invento? Comendo o dicionário, bem temperadinho com pimenta-do-reino-perdido e sal-de-cozinha-psicodélica, proponho-me a regurgitar, como no espectro de um caleidoscópio ilógico, todas as palavras novavelhas pós-modernas calcadas no caos pusilânime e enerve que nos alardeia, impunemente.

Ou melhor seria mesmo deletar o dicionário, ir tirando dele, culpado de nossa riqueza vocabular vasta e limitada, todos os verbetes que atormentam a convivência humana. Tornar-nos-íamos mudos. Mumumumudos, murmurando o barulho onipresente do silêncio. Silêncio renitente. Apavorante. Sim, taciturnos e sorumbáticos, mas mudos, portanto sem blá-blá-blás nem solilóquios.

Não invento palavras; desinvento-as. Componho despalavras que refletem o nada existencial do ser humano contemporâneo, perdido entre cifras e nomes, símbolos e cartas, álcool e remédios, e tédio, e tédio, e prédios infinitos.

(Prometo meter a meta na gaveta. Para que não haja suicídio coletivo, todas as armas ficarão longe da alma palavra.)

Como vovó já dizia, quem semeia vento colhe tempestade. Palavras, palavras, palavras... que é um adágio, senão um punhado delas, organizadas sintática e semanticamente, que nos apunhá-la pelas costas, nos fere, adaga? Indago porque palavra usa uma pá que lavra só em vento, que invento em pensamento. Nada de concreto brota.

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