30.6.10
29.6.10
28.6.10
Para começar a semana
"O que as vitórias têm de mau é que não são definitivas. O que as derrotas têm de bom é que também não são definitivas."
José de Sousa Saramago (1922-2010)
27.6.10
26.6.10
Luar
sofrendo caladas as pessoas estão lá exercendo suas vidas
paternidades hematomas atletismos ócios leituras prazeres
a lua não para para vê-las apontar com o dedo
a lua do alto de sua nobreza permanece alheia a tudo
pasmaceira
a vida inteira correndo atrás de uma pontuação que fosse adequada
como se houvesse
as emoções o amor as lágrimas a vitória o tédio tudo tudo tudo
não cabe
por isso a lua finge que nem ri
fica lá toda cheia de si alumiando os que nela insistem em namorar.
paternidades hematomas atletismos ócios leituras prazeres
a lua não para para vê-las apontar com o dedo
a lua do alto de sua nobreza permanece alheia a tudo
pasmaceira
a vida inteira correndo atrás de uma pontuação que fosse adequada
como se houvesse
as emoções o amor as lágrimas a vitória o tédio tudo tudo tudo
não cabe
por isso a lua finge que nem ri
fica lá toda cheia de si alumiando os que nela insistem em namorar.
Porque hoje é sábado
Cartão de Natal
Pois que reinaugurando essa criança
pensam os homens
reinaugurar a sua vida
e começar novo caderno,
fresco como o pão do dia;
pois que nestes dias a aventura
parece em ponto de voo, e parece
que vão enfim poder
explodir suas sementes:
que desta vez não perca esse caderno
sua atração núbil para o dente;
que o entusiasmo conserve vivas
suas molas,
e possa enfim o ferro
comer a ferrugem
o sim comer o não.
(João Cabral de Melo Neto)
Pois que reinaugurando essa criança
pensam os homens
reinaugurar a sua vida
e começar novo caderno,
fresco como o pão do dia;
pois que nestes dias a aventura
parece em ponto de voo, e parece
que vão enfim poder
explodir suas sementes:
que desta vez não perca esse caderno
sua atração núbil para o dente;
que o entusiasmo conserve vivas
suas molas,
e possa enfim o ferro
comer a ferrugem
o sim comer o não.
(João Cabral de Melo Neto)
25.6.10
24.6.10
Instante da estante
ANDRADE, Carlos Drummond de. Sentimento do mundo. In: Nova reunião: 23 livros de poesia. Vol. 1. Rio de Janeiro: BestBolso, 2009.
23.6.10
22.6.10
21.6.10
Para começar a semana
"Estamos afundados na merda do mundo e não se pode ser otimista. O otimista, ou é estúpido, ou insensível ou milionário."
José de Sousa Saramago (1922-2010)
20.6.10
19.6.10
Porque hoje é sábado
Agora
Agora que a agora é nunca
Agora posso recuar
Agora sinto minha tumba
Agora o peito a retumbar
Agora a última resposta
Agora quartos de hospitais
Agora abrem uma porta
Agora não se chora mais
Agora a chuva evapora
Agora ainda não choveu
Agora tenho mais memória
Agora tenho o que foi meu
Agora passa a paisagem
Agora não me desperdi
Agora compro uma passagem
Agora ainda estou daqui
Agora sinto muita sede
Agora já é madrugada
Agora diante da parede
Agora falta uma palavra
Agora o vento no cabelo
Agora toda minha roupa
Agora volta pro novelo
Agora a língua em minha boca
Agora meu avô já vive
Agora meu filho nasceu
Agora o filho que não tive
Agora a criança sou eu
Agora sinto um gosto doce
Agora vejo a cor azul
Agora a mão de quem me trouxe
Agora é só meu corpo nu
Agora eu nasço lá de fora
Agora minha mãe é o ar
Agora eu vivo na barriga
Agora eu brigo pra voltar
Agora...
(Arnaldo Antunes)
Agora que a agora é nunca
Agora posso recuar
Agora sinto minha tumba
Agora o peito a retumbar
Agora a última resposta
Agora quartos de hospitais
Agora abrem uma porta
Agora não se chora mais
Agora a chuva evapora
Agora ainda não choveu
Agora tenho mais memória
Agora tenho o que foi meu
Agora passa a paisagem
Agora não me desperdi
Agora compro uma passagem
Agora ainda estou daqui
Agora sinto muita sede
Agora já é madrugada
Agora diante da parede
Agora falta uma palavra
Agora o vento no cabelo
Agora toda minha roupa
Agora volta pro novelo
Agora a língua em minha boca
Agora meu avô já vive
Agora meu filho nasceu
Agora o filho que não tive
Agora a criança sou eu
Agora sinto um gosto doce
Agora vejo a cor azul
Agora a mão de quem me trouxe
Agora é só meu corpo nu
Agora eu nasço lá de fora
Agora minha mãe é o ar
Agora eu vivo na barriga
Agora eu brigo pra voltar
Agora...
(Arnaldo Antunes)
18.6.10
17.6.10
Instante da estante
ANDRADE, Carlos Drummond de. Brejo das almas. In: Nova reunião: 23 livros de poesia. Vol. 1. Rio de Janeiro: BestBolso, 2009.
Breve relato do lugar-comum
a técnica do ponteiro
não tem segredo
nem escanteio:
eu fico sempre olhando fixamente
como se o relógio não tivesse lógica
e meu olhar pudesse adiantá-lo
num pulo do tempo
atento
abrupto.
enquanto o ponteiro não adianta
cada letra é uma dor
cada palavra, um tormento:
o tempo parado não tem pena
dos olhos vidrados no silêncio.
não tem segredo
nem escanteio:
eu fico sempre olhando fixamente
como se o relógio não tivesse lógica
e meu olhar pudesse adiantá-lo
num pulo do tempo
atento
abrupto.
enquanto o ponteiro não adianta
cada letra é uma dor
cada palavra, um tormento:
o tempo parado não tem pena
dos olhos vidrados no silêncio.
16.6.10
Carta
Estou no meu limite físico. Não aguento mais me dedicar à madeira -- talvez, por extensão, à marcenaria. A gota d'água vem cada vez que eu capricho de sobremaneira em uma peça e leio, no dia seguinte, que algum torno desavisado ou serra um pouco mais afiada estragou justamente o estrepe pela qual tinha maior apreço. São gotas d'água. Um conta-gotas que pinga constantemente em minha testa, como se torturado fosse naquelas fábulas orientais. Tenho pensado em alternativas: será que uma serralheria não me contrataria para ficar debruçado sobre metal tanto quanto faço com madeira? Será que um dia esculpirei uma pela que realmente renda alguma coisa (e isso signifique um dinheiro razoavelmente maior do que os cem pilas que pulam em minha conta bancária trimestralmente)? Será que vale a pena me reinventar mais uma vez -- como fiz na transição Paris-São Paulo -- e seguir insistindo nessa de marcenaria convencional? Sou só interrogações, meu caro. Nenhuma resposta. Mas às vezes eu queria conseguir ter tempo para me dedicar à marcenaria que tanto amo. Às vezes eu queria só sair de casa sabendo que, como em quase todas as profissões, eu terei horário certo para pegar minhas coisas e voltar para o lar, tomar uma cerveja e dormir em paz. Às vezes eu queria saber que meu estrepe bem-desenhado é tão importante que nenhum equipamento mecânico maligno irá extirpá-lo sem critério. Às vezes -- quase sempre -- eu queria só saber direito o que eu quero mesmo.
Poema para você que dorme agora
eu queria inventar um beijo
que fosse capaz de abraçá-la
por inteiro
porque aos pedaços que sou
não consigo simbolizar-me
apaixonado
eu queria construir um sonho
na qual coubesse meu amor
completo
porque do tamanho que ele é
ninguém pode nem desenhá-lo
totalmente
eu queria percorrer seu corpo
como se meus dedos fossem pés
sutis
porque para um astronauta
cada passo é um compasso
de uma dança
eu queria rimar estes versos
de um jeito tão bonito quanto
eterno
mas é na brancura nascente
que eles contrastam sinceros
com sua beleza.
que fosse capaz de abraçá-la
por inteiro
porque aos pedaços que sou
não consigo simbolizar-me
apaixonado
eu queria construir um sonho
na qual coubesse meu amor
completo
porque do tamanho que ele é
ninguém pode nem desenhá-lo
totalmente
eu queria percorrer seu corpo
como se meus dedos fossem pés
sutis
porque para um astronauta
cada passo é um compasso
de uma dança
eu queria rimar estes versos
de um jeito tão bonito quanto
eterno
mas é na brancura nascente
que eles contrastam sinceros
com sua beleza.
15.6.10
14.6.10
13.6.10
12.6.10
Porque hoje é sábado
A tua mão no meu braço
Foi um momento
O em que pousaste
Sobre o meu braço,
Num movimento
Mais de cansaço
Que pensamento,
A tua mão
E a retiraste.
Senti ou não?
Não sei. Mas lembro
E sinto ainda
Qualquer memória
Fixa e corpórea
Onde pousaste
A mão que teve
Qualquer sentido
Incompreendido,
Mas tão de leve!...
Tudo isto é nada,
Mas numa estrada
Como é a vida
Há uma coisa
Incompreendida...
Sei eu se quando
A tua mão
Senti pousando
Sobre o meu braço,
E um pouco, um pouco,
No coração,
Não houve um ritmo
Novo no espaço?
Como se tu
Sem o querer,
Em mim tocasses
Para dizer
Qualquer mistério,
Súbito e etéreo,
Que nem soubesses
Que tinha ser.
(Fernando Pessoa)
Foi um momento
O em que pousaste
Sobre o meu braço,
Num movimento
Mais de cansaço
Que pensamento,
A tua mão
E a retiraste.
Senti ou não?
Não sei. Mas lembro
E sinto ainda
Qualquer memória
Fixa e corpórea
Onde pousaste
A mão que teve
Qualquer sentido
Incompreendido,
Mas tão de leve!...
Tudo isto é nada,
Mas numa estrada
Como é a vida
Há uma coisa
Incompreendida...
Sei eu se quando
A tua mão
Senti pousando
Sobre o meu braço,
E um pouco, um pouco,
No coração,
Não houve um ritmo
Novo no espaço?
Como se tu
Sem o querer,
Em mim tocasses
Para dizer
Qualquer mistério,
Súbito e etéreo,
Que nem soubesses
Que tinha ser.
(Fernando Pessoa)
11.6.10
10.6.10
Instante da estante
ANDRADE, Carlos Drummond de. Alguma poesia. In: Nova reunião: 23 livros de poesia. Vol. 1. Rio de Janeiro: BestBolso, 2009.
9.6.10
8.6.10
7.6.10
6.6.10
26. A luz que alumina incansavelmente
Para exercer a troca constante de fluidos corporais, dormiam um dentro do outro.
- Não nos cansamos.
- Aguentamos com prazer intenso.
- Amenzamos.
Já haviam combinado inclusive que a morte seria simultânea, num longo abraço, quando velhinhos se sentissem.
- Amamo-nos.
- Queremo-nos.
Porque só assim eram luz. Luzes. Sempre acesas.
- Não nos cansamos.
- Aguentamos com prazer intenso.
- Amenzamos.
Já haviam combinado inclusive que a morte seria simultânea, num longo abraço, quando velhinhos se sentissem.
- Amamo-nos.
- Queremo-nos.
Porque só assim eram luz. Luzes. Sempre acesas.
5.6.10
Porque hoje é sábado
Rapte-me camaleoa
Rapte-me camaleoa
Adapte-me a uma cama boa
Capte-me uma mensagem à-toa
De um quasar pulsando loa
Interestelar canoa
Leitos perfeitos
Seus peitos direitos me olham assim
Fino menino me inclino pro lado do sim
Rapte-me, adapte-me, capte-me
It’s up to me
Coração
Ser querer, ser merecer, ser um camaleão
Rapte-me camaleoa
Adapte-me ao seu
Ne me quitte pas
(Caetano Veloso)
Rapte-me camaleoa
Adapte-me a uma cama boa
Capte-me uma mensagem à-toa
De um quasar pulsando loa
Interestelar canoa
Leitos perfeitos
Seus peitos direitos me olham assim
Fino menino me inclino pro lado do sim
Rapte-me, adapte-me, capte-me
It’s up to me
Coração
Ser querer, ser merecer, ser um camaleão
Rapte-me camaleoa
Adapte-me ao seu
Ne me quitte pas
(Caetano Veloso)
4.6.10
3.6.10
2.6.10
1.6.10
No radinho de pilha
"If you really like it you can have the rights,
It could make a million for you overnight"
in fact
denuncia a sombra os ombros de guarda-chuva
a proteger os desejos
a luxúria
os encantos mais desencontrados e inefáveis
por enquanto, doentes.
e cada anúncio fixado na janela
é um poente derramado
para ela
só para ela
que dorme vestida de nua
deitada em sonhos de frente e verso.
dentro da consciência nervosa, em tiques
um universo guardado
bigbangueia eternamente
como se o nascimento fosse uma frequência
e a riqueza se cansasse de tanto gastar
o que ninguém tem.
mas é tudo fricção
mas é tudo ficção
tirante os ombros que se quedam
parecidos com as sombras que tentam
reinventar-se.
a proteger os desejos
a luxúria
os encantos mais desencontrados e inefáveis
por enquanto, doentes.
e cada anúncio fixado na janela
é um poente derramado
para ela
só para ela
que dorme vestida de nua
deitada em sonhos de frente e verso.
dentro da consciência nervosa, em tiques
um universo guardado
bigbangueia eternamente
como se o nascimento fosse uma frequência
e a riqueza se cansasse de tanto gastar
o que ninguém tem.
mas é tudo fricção
mas é tudo ficção
tirante os ombros que se quedam
parecidos com as sombras que tentam
reinventar-se.
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